Filmes latinos comandam 9º dia da Mostra Internacional de Cinema

Longas argentinos e brasileiros são destaques da Mostra em São Paulo

Fonte: Márcio Sallem - Correspondente especial JP

Este nono dia seria o mais latino americano da 43ª Mostra Internacional de Cinema, se não fosse o norte-americano “Saint Frances”. É a narrativa típica do cinema independente do país, em que uma mulher, no auge de seus 34 anos de idade, ainda não encontrou o emprego dos sonhos ou o companheiro para ter filhos, como a sociedade espera que ela faça. Em vez disto, tratou de viver a vida conforme suas próprias regras e colher os frutos, doces ou amargos, que plantou. Sua vida, porém, começa a mudar quando é contratada como babá da primogênita de um casal homoafetivo ao mesmo tempo em que aborta do filho não planejado que trazia no ventre.

É o tipo de narrativa não condescendente com suas personagens, mas que também não pede desculpa pelas conquistas do feminismo nem permissão pelas que estão batalhando no instante, dentre elas, que as mulheres estejam, como uma irmandade, na mesma página. E isto é feito à medida que a protagonista, Bridget, começa a aceitar o fato de que não deve satisfação à sociedade por não haver alcançado o que é exigido das mulheres nesta mesma idade e, mais importante, entende a importância de manifestar seus sentimentos. É um filme simples, porém que conta com atuações de destaque e, mais importante, ideias no lugar certo.

Afora este, Brasil e Argentina brilharam no nono dia. Do país dos ‘hermanos’, a comédia “A Odisseia dos Tontos”, que é o candidato do país ao Oscar do próximo ano e que evidencia a penúria por que passa o cinema argentino contemporâneo com a redução dos repasses do INCAA (que é a Ancine de lá). Tendo no elenco Ricardo Darín, a comédia trata de, vejam só, a crise econômica nos anos 2000. Um grupo precisa bolar um assalto para reaver o dinheiro que era seu originalmente, antes de o banco congelar as retiradas – em um movimento parecido com o que ocorreu quando Fernando Collor era presidente. Como os eventos se desenrolam é o charme de uma narrativa camarada, mas que, em um bom ano do cinema argentino, jamais seria a escolhida para disputar o Oscar.

No Brasil, Sandra Kogut apresentou o seu “Três Verões”, comédia que, como o próprio nome sugere, acompanha as desventuras de Madá, personagem de Regina Casé, a governanta da casa de condomínio de um rico empresário que vê sua vida virar do avesso quando este é preso pela Polícia Federal. Debatendo o Brasil de hoje pelos olhos daqueles que servem a classe média-alta, a narrativa tem ideias que não são bem desenvolvidas, creio que seja porque a diretora esteja muito apaixonada com a improvisação bem-humorada de Regina Casé – em um papel bastante semelhante com aquele de “Que Horas Ela Volta?”. A sensação é a de que a narrativa está a serviço da atriz, não o contrário, que seria o correto, preferindo o humor fácil – e os risos têm uma frequência boa – em detrimento da crítica social que parecia construir e que é arruinada na cena final.

Também do Brasil, o documentário vencedor do prêmio da categoria no Festival de Veneza, “Babenco – Alguém tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou”, em que Bárbara Paz, sua ex-companheira, debate seus últimos dias de vida a luz de sua vida e arte retratada na curadoria de seus filmes (como “O Beijo da Mulher Aranha” e “Pixote, A Lei do Mais Fraco”). Com um preto e branco que enverniza a memória do diretor argentino radicado brasileiro, Bárbara também é afetuosa em como trata a memória de Babenco e procura trilhar um caminho mais poético do que racional. É bonito, merecedor do prêmio recebido e revelador, até mesmo para quem não gostava da obra do diretor.

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