PMs de Anajatuba são investigados pelo crime de tortura

Vítima, que foi espancada e mantida em cárcere, denunciou abuso de poder por partes dos agentes públicos.

Fonte: Luciene Vieira

tortura é um costume, um ato bárbaro, que, quase 36 anos depois do fim da ditadura militar no Brasil, ela insistiria em sobreviver na mentalidade de policiais militares como Amarildo Estrela Paixão Júnior, de 27 anos; Samuel Alves de Sousa, 30; e Leandro Silva Pereira, 35. Amarildo Estrela (tenente), Samuel Alves e Leandro Silva estão sendo investigados pela Polícia Civil do Maranhão por serem suspeitos de cometer uma ação executada com crueldade, contra um trabalhador de 32 anos.

Os três policiais teriam dado uma “surra” na vítima, com objetivo de conseguirem informações sobre suspeitos de tráfico de drogas, e confissões de crimes que o torturado jamais cometeu. Os maus-tratos, uso excessivo da força, abuso de autoridade e lesão corporal, que tudo indica praticados pelos três militares, ocorreram há dois dias, na localidade Campinho, no município de Anajatuba, distante 143 km de São Luís.

A data e o horário da sessão de espancamento: 10h:50 da última sexta-feira (31). A vítima de tortura: um homem de 32 anos, que mora no povoado São José, em Anajatuba, e trabalha como motorista autônomo, fazendo transporte de carne de açougues daquela cidade. Quem conhece aquele que foi torturado pelos três militares afirma que se trata de um jovem calmo, sem antecedentes criminais, e de qualidades inerentes, ou seja, bom caráter e temperamento.

Nessa sexta-feira, a bordo de sua motocicleta Honda Bis, de cor vermelha, a vítima saiu de sua casa em direção ao Campinho, um lugar de Anajatuba que fica no fim da Rua do Fio, onde iria coletar esterco de gado, material orgânico muito utilizado como adubo em plantações.

No Campinho, o trabalhador desceu do veículo, e, no exato momento em que abria o bagageiro da motocicleta para tirar uma sacola na qual armazenaria o esterco de gado, a vítima foi abordada pelos policiais militares Amarildo Estrela, Samuel Alves e Leandro Silva Pereira.

Já jogado ao chão, de bruços na terra com esterco de gado, algemado, entre chutes e pauladas, o morador de Anajatuba era interrogado por Amarildo, Samuel e Leandro. “Você é usuário de drogas?” – questionaram os policiais ao motorista. Os militares não pediram os documentos pessoais de identificação da vítima, perguntaram a ela apenas o seu nome.

Quiseram, inclusive, saber informações sobre suspeitos de tráfico de drogas, que supostamente comercializariam os entorpecentes nos povoados Mato Grosso e Bacabal, em Anajatuba. Pessoas que já seriam conhecidas da polícia, pela suposta atuação delas no tráfico de drogas daquela cidade.

TERMO DE DECLARAÇÕES  

Todas essas informações já citadas estão descritas no documento Termo de Declarações registrado pela vítima, na Delegacia de Polícia Civil de Anajatuba. Nele está escrito que a vítima sofreu com um golpe físico chamado de “telefone”, pancada simultânea com as duas mãos nos dois ouvidos da vítima, causando excessiva pressão nos tímpanos. De acordo com o relato do motorista, os policiais quebraram vários pedaços de madeira batendo na sola dos seus pés, para que ele confessasse onde estaria escondida determinada droga.

“O Campinho é um local deserto, sem movimentação de pessoas. Os policiais o abordaram de forma agressiva, espancando-o, enquanto o interrogavam sobre suposto porte de drogas para consumo. Quanto mais dizia não possuir drogas, mais ele apanhava. Insatisfeitos, os policiais passaram a exigir que a vítima dissesse quem eram os vendedores de drogas da região”, repassou uma fonte ouvida pelo Jornal Pequeno.

Mais informações são que a vítima implorou para que cessassem as agressões, chegando a afirmar ser irmão de um policial civil. Ocorre que esta declaração teria irritado ainda mais Amarildo Estrela, Samuel Alves e Leandro Silva.

POLICIAIS ALEGAM DESACATO 

Amarildo Estrela, Samuel Alves e Leandro Silva estão lotados no 28º Batalhão da Polícia Militar (28º BPM), sediado em Itapecuru-Mirim, mas com atuação em Anajatuba, cuja distância de uma cidade à outra é de aproximadamente 44,7 quilômetros. Amarildo, Samuel e Leandro não encontraram drogas com a vítima torturada por eles. Devido à ausência de entorpecentes,, os três militares usaram como justificativa para a sessão de espancamento o crime de desacato.

Conforme apuração do JP, um boletim de ocorrência (BO) chegou a ser registrado pelos policiais militares contra a vítima. No BO, Amarildo, Samuel e Leandro disseram que faziam rondas no Campinho, quando encontraram o mototaxista dentro de uma casa. Os militares disseram ainda no BO que a vítima espancada (por eles) tentou fugir, teria caído em uma vala, quando foi abordada e feito a revista pessoal. Neste momento, segundo o boletim de ocorrência registrado pelos militares, o mototaxista teria cometido o crime de desacato.

VÍTIMA FOI PRESA E MANTIDA EM CÁRCERE 

Após ter sido torturada, a vítima foi presa em Anajatuba, ainda na manhã de sexta-feira, ficando na cela da delegacia de Anajatuba das 11h30 às 14h30, quando foi liberada. Por volta das 17h, o motorista foi levado pela polícia para a delegacia de Itapecuru-Mirim, a pedido do delegado Renilton Ferreira, que estava no plantão, e queria colher o depoimento da vítima, o que se estendeu até à noite.

O delegado Renilton teria entendido que não houve desacato de autoridade, e na delegacia de Itapecuru-Mirim abriu o processo de investigação contra os três militares, em razão do possível crime de tortura. A vítima, inclusive, foi liberada pelo delegado e encaminhada ao Instituto Médico Legal (IML), para a realização do exame de corpo delito, que comprovará a sessão de espancamento.

Os três policiais também foram ouvidos pelo delegado. Eles apresentaram a versão de que a vítima tinha se machucado, devido ter corrido e caído na vala. Também, que o mototaxista teria dito as seguintes frases aos militares: “O mundo é uma roda gigante. Hoje vocês estão por cima, amanhã poderão estar por baixo”. Isso teria sido entendido pelos policiais como uma ameaça do motorista.

OUTRO LADO

Procurado pelo Jornal Pequeno, o comando do 28º BPM informou que os três militares já foram chamados para prestar depoimento sobre a reclamação de uso da força feita pelo motorista. E que os policiais negaram a tortura, justificando que as lesões apresentadas pela suposta vítima teriam sido adquiridas porque, ao ser abordada, ela correu e caiu numa vala. Também que o motorista teria fugido de um local conhecido pela prática de tráfico de drogas.

O comando do 28º BPM também repassou que os militares disseram ter sido ameaçados e ofendidos pelo motorista, momento no qual ele recebeu voz de prisão. E que um processo administrativo foi aberto para apurar o ocorrido, dando a chance da ampla defesa.

LEI PUNE O CRIME DE TORTURA 

Em 7 de abril de 1997, foi promulgada a lei 9.455, que pune o crime de tortura. Segue trecho do artigo 1:

I – Constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico e mental.

  1. Com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
  2. Para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
  3. Em razão de discriminação racial ou religiosa.

II – Submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

AS PENAS E OS CRIMES 

21 ANOS – esta é a pena máxima, quando há agravantes, quando há tortura seguida de morte.

13 ANOS – este é o tempo máximo de reclusão, quando acontece tortura com lesão corporal grave.

12 ANOS – esta é a pena máxima de reclusão para lesão corporal com morte. Lesão corporal sem agravante, 1 ano. Se deixar sequelas, vai de 5 a 8 anos.

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