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Eterno Grêmio Lítero Recreativo Português terá sua história contada em livro

Associação foi fundada por famílias portuguesas, na década de 30, e, durante muitos anos, foi um dos maiores clubes esportivos da capital

Fonte: Luciene Vieira

Em 1931, famílias portuguesas instaladas em São Luís, que resolveram buscar uma nova vida longe da região fria e irregular onde viviam, fundaram na capital maranhense o Grêmio Lítero Recreativo Português (GLRP). Já adaptada na cidade, a comunidade lusitana quis diversão, que poderia tê-la nas reuniões de leitura, realizadas por ela na biblioteca do prédio histórico do GLRP, localizado até hoje na Rua do Sol, em frente à Praça João Lisboa, no Centro.

Durante muitos anos, o Lítero foi um dos principais pontos de recreação da sociedade ludovicense (Foto: Reprodução)

Mas o desejo não coube apenas nos encontros literários, criou-se a associação, que anos mais tarde os portugueses a transformaram numa coisa festiva. E assim surgiu um dos maiores e melhores clubes esportivos e de entretenimento da história de São Luís: o Lítero, cuja estrutura foi construída no bairro do Anil. Acontece que, depois de três gerações de famílias lusitanas, o clube acabou, e posteriormente o imóvel foi vendido. Porém, a associação em nenhum segundo deixou de existir, e sua história está prestes a se tornar um livro.

O Grêmio Lítero Recreativo Português nasceu numa época em que quase dois milhões de portugueses emigraram para o Brasil (entre 1850 a 1930). A vinda de imigrantes lusitanos nos primeiros anos da República teve números elevados. Somente nas três primeiras décadas do século 20, cerca de 754 mil desembarcaram no país, segundo o IBGE. Entre os motivos para a chegada de tantos em solo brasileiro, o principal seria a ordem econômica.

A parte do norte de Portugal apresentava uma escassez muito grande e o Brasil tinha uma enorme perspectiva de prosperidade, de construir a América. Além disso, existia uma facilidade com o idioma e a religiosidade, majoritariamente católica. E a chegada de portugueses criava uma articulação de redes de amizades para que outros também viessem. Uma parte escolheu o Maranhão como fragmento do cenário desta história. Mas existiu uma distância mais do que física que separava Brasil e Portugal. Existiu uma exaltação da nostalgia à terra de Camões. Seria como se eles sentissem uma grande necessidade de saber que não estavam perdidos no Brasil.

“Quando criaram o GLRP, os portugueses queriam matar a saudade de Portugal, dos familiares que deixaram lá”, declarou o atual presidente do Grêmio Lítero Recreativo Português, o advogado Carlos Nina.

SAUDADE FUNCIONA PARA REALIMENTAR O PRESENTE

Toda essa espécie de saudade, melancolia, mencionada por Carlos Nina, trouxe um benefício. Os portugueses em São Luís teriam feito dela uma maneira de ter presente aquilo que já não estava presente, como uma chama que sobrevive no interior, uma vida que continua. E esse é um lado positivo do saudosismo.

De acordo com Nina, que disse ter crescido fazendo aulas de natação nas piscinas do Lítero Recreativo, o espaço no bairro do Anil foi utilizado para grandes e memoráveis bailes de carnaval, que reuniram muita gente elegante. Serviu também como endereço assíduo para encontros políticos importantes, inclusive o clube foi frequentado pelo ex-presidente da República, e ex-governador do Maranhão, José Sarney. Além disso, havia campo de futebol, áreas de banho e salões para jogos.

Até os anos de 2004 e 2005, ainda eram organizadas festas no Lítero. Mas depois disso, o local teria sido fechado. Nina informou que a ascensão dos condomínios com sua própria área de lazer, a criação dos shoppings, o fim dos bailes de carnaval, e o alto índice de inadimplência dos sócios do GLRP são apontados como os grandes responsáveis pela derrocada do clube.

O REDESCOBRIMENTO DO LÍTERO RECREATIVO

Ocorre que, no imaginário de muitos maranhenses, o Grêmio Lítero Recreativo Português era somente o Clube Lítero. E isso faz a associação sofrer com esta ideia de que o Maranhão não sabe quem ela é, onde ela está, e de onde ela vem. O GLRP tem hoje 88 anos.

No dia 6 de agosto de 2020, ele vai festejar seus 89 anos. Nesta data, de acordo com Carlos Nina, será lançado um livro que conta a história da associação e de associados, como dos 13 ex-presidentes do Grêmio Lítero Recreativo Português. A obra deverá ser o primogênito do projeto “Fênix”, idealizado por Nina; o presidente do GLRP é um otimista incorrigível. Ele contou que no material haverá informações sobre os tais encontros literários; que, inclusive, vários livros foram doados à época por José Sarney, para a biblioteca do Lítero.  Podem ser esperados também registros de atividades políticas, esportivas e eventos sociais.

Em outubro de 2018, as trigêmeas Lara, Laís e Ada Mesquita de Macedo, de 22 anos, foram convidadas pelo presidente do Lítero a fazerem o resgate histórico da associação portuguesa. Laís e Ada cursam Direito, e Lara Administração, na Universidade Federal do Maranhão (Ufma). Elas participaram da primeira edição do Concurso Anual de Texto (CAT) do Lítero, realizada em 2017, e devido a isso foram convidadas a participarem do projeto Fênix.

Na entrevista concedida ao Jornal Pequeno, estavam apenas Lara e Laís, e o presidente Carlos Nina. As irmãs contaram que o “fio da meada” para a elaboração do livro foi procurarem os familiares dos 13 ex-presidentes do GLRP. “Vamos redescobrir o Lítero. Mas diremos mais, vamos destacar que esta instituição contribuiu de forma significativa para a história de São Luís”, informaram Lara e Laís.

Laís e Lara Mesquita, com o advogado Carlos Nina, atual presidente do Grêmio Lítero Recreativo Português (Foto: Gilson Ferreira)

As jovens pesquisadoras já realizaram mais de 20 entrevistas com ex-presidentes, e com amigos e familiares de expresidentes falecidos. Elas também digitalizaram aproximadamente 800 arquivos, entre fotos, atas de reuniões, ofícios, e matérias jornalísticas sobre a instituição; muitas delas publicadas no JP.

Lara e Laís contaram que estiveram nas bibliotecas Benedito Leite, da Associação Comercial do Maranhão (ACM) e do GLRP. “Também pegamos acervos pessoais de famílias da comunidade lusitana, e do Consulado Português no Maranhão”, informaram as universitárias.

EMPREENDEDORISMO LUSITANO

Há marcas óbvias, como a língua e a arquitetura, que fazem de São Luís a capital mais lusitana das capitais brasileiras. Mas também pequenas coisas que a população desconhece. E o empreendedorismo é a sua marca principal, conforme Laís e Lara. Elas contaram um pouco do que descobriram revirando a história do Grêmio Lítero, e ouvindo as memórias de quem fez e ainda faz parte da associação.

De acordo com as jovens pesquisadoras, o português Manoel Alves Ferreira, um expresidente falecido do Lítero, foi quem trouxe as novidades do setor mercantil dos Estados Unidos para a cidade, décadas passadas. O pai de Manoel era o dono da rede de supermercados “Lusitanas”. Mas foi o filho viajante quem modernizou os negócios da família.

“Manoel tinha um perfil de administrador também no GLRP. E detalhes disso contaremos no livro”, informou Laís. Elas contaram também que portugueses teriam rapidamente ganhado a área urbana de São Luís, no caso, o Centro.

As trigêmeas descobriram na pesquisa para o livro que um dos ex-presidentes do Lítero, Antônio D’Oliveira, foi o dono do Hotel Central, empreendimento que foi um marco para o setor hoteleiro da capital maranhense. “A história dele é tão incrível, que seria muito fácil produzirmos um material só sobre ele”, disse Lara.

As irmãs complementaram que outro ex-presidente da associação portuguesa foi Manoel da Silva Vilas Boas, dono de uma construtora, e que teria utilizado a sua empresa na pavimentação de algumas das mais importantes vias de São Luís.

LÍTERO DO PRESENTE

Além do projeto Fênix, Carlos Nina fez muito mais nos últimos anos da associação, que competem à gestão do advogado na presidência do GLRP. Desde 2017, ele criou e tem mantido o Concurso Anual de Textos (CAT), um projeto que estimula a produção de textos por maranhenses que, talvez, nem sejam habituados a escrever ou que não cobiçam fazer carreira como escritores, mas que se desafiam neste mundo, quando uma oportunidade é oferecida a produzirem trabalhos, conforme temas.

Sede do Grêmio Lítero Recreativo Português, na Rua do Sol – centro de São Luís (Foto: Gilson Ferreira)

O CAT edição 2020 está com inscrições abertas. Todos os detalhes, inclusive o tema deste ano do concurso, podem ser consultados no site do Lítero. A partir de 2018, Nina realizou o Torneio Infantil de Futsal, em parceria com o Instituto Beneficente Áurea Faria. Em 2019, Carlos Nina inaugurou a Câmara de Mediação de Arbitragem. E, atualmente, o presidente do Lítero tem se dedicado ao projeto Convívio Intercultural, um tipo de encontro com brasileiros, portugueses, italianos e libaneses, que moram em São Luís.

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