Em bairros populares de São Luís, o temor é que o vírus se espalhe pela falta de saneamento

A falta de esgoto é um agravante histórico nas palafitas distribuídas pela São Luís.

Fonte: Luciene Vieira

A falta de esgoto é um agravante histórico nas palafitas distribuídas pela São Luís. Na Vila Palmeira, existem 17 casos confirmados de coronavírus. Na Rua Nonato Silva deste bairro, muitas famílias moram nas edificações em cima de áreas alagadas, com um “rio de lixo” sob elas. É o caso do agricultor Paulo de Assis Oliveira, de 48 anos; sua mulher, Ana Carla Marques dos Santos, 29; e seus quatros filhos crianças, cujas idades são 7, 5 e 3 anos, e o caçula de dois meses.

A casa de Paulo de Assis está instalada em uma área, cujos indicadores sociais estão entre os mais críticos da capital maranhense. Segundo Paulo, ele e sua família são de Buriticupu, vieram para a capital maranhense no dia 13 de março deste ano, após Paulo ter sido picado por um inseto barbeiro, e ter tido complicações no coração.

“Meu coração cresceu quatro centímetros, fui diagnosticado com a Doença de Chagas. Meu tratamento está interrompido, devido à pandemia, mas sobrevivo à base de remédios”, informou o agricultor. O lugar onde ele e a família moram é um espaço de quatro cômodos pequenos. No quintal, uma geladeira velha e sem tampa serve como caixa d’água; ou seja, toda a água da família fica armazenada nesse recipiente improvisado. E o banheiro não teria caixa de inspeção, fossa séptica e sumidouro.

A família de Paulo e outras famílias das palafitas da Rua Nonato Silva vivem em péssimas condições de higiene. O agricultor e seus vizinhos disseram que se preocupam com a evolução da pandemia, mas nenhum deles foi visto usando máscaras.

“Estamos em casa, mas é preciso contar com um pouco de sorte, diante do local em que vivemos, para não sermos contagiados. Eu preciso iniciar meu processo de aposentadoria, pois não temos dinheiro, e eu não posso mais trabalhar. Semana passada recebi cesta básica do Corpo de Bombeiros, então temos ainda comida. São muitos problemas para mim”, declarou Paulo.

“Acho que o primeiro desafio foi existir a arrecadação e distribuição de itens de limpeza pessoal, água mineral e alimentos para quem mais precisa. Na minha casa, estamos esperando que saia ainda a primeira parcela do auxílio de R$ 600. Ainda não sei de nenhum caso de Covid-19 nesta rua, mas temos medo, sim”, disseram os irmãos adolescentes Jailson e Rafaela Mineiro, enquanto retiravam as roupas do varal fixados em suportes de madeira da ponte, feita com tábuas de madeira, que dá acesso às palafitas.

Por todos os lados de São Luís, é possível sentir o clima de medo. Entretanto, ainda foi possível a equipe de reportagem do Jornal Pequeno verificar o movimento impróprio para este período de “isolamento social”, em vias comerciais e residenciais da Vila Palmeira, onde há os 17 casos confirmados de Covid-19; no bairro da Liberdade, com 39 casos confirmados; e no bairro do Sá Viana, com seis pessoas infectadas.

Durante esta semana, o JP também constatou aglomeração nas áreas de feiras populares, no Bairro de Fátima (42 casos), Madre Deus (2), e Anjo da Guarda (4), mesmo que a maior parte dos estabelecimentos comerciais, destas regiões, só estejam permitindo a entrada de clientes com máscara.

Na Vila Palmeira, Liberdade e Sá Viana, as pessoas ainda se expõem ao sentar nas portas de residências e pontos comerciais. Uma criança sem máscara brincava ontem com o cachorro, em uma rua da Liberdade.

Em outra via da Liberdade, um garoto sem máscara e descalço retirava água com um balde, de uma cisterna instalada na calçada de um imóvel. E noutra rua próximo dali, vizinhos agrupados conversando nas portas de residências.

Grávida de oito meses, a dona de casa Fernanda Dias da Silva, de 21 anos, mora com o marido e três filhos, de 1, 4 e 6 anos, num barraco de seis metros quadrados. Ela contou sua história, depois de ter subido uma ladeira do bairro Sá Viana, e percebido que a via era fotografada pelo fotógrafo do JP.

Abordada pela equipe de reportagem deste jornal, mas sem permitir que tivesse sua imagem registrada, Fernanda disse que, no casebre, ela cozinha, faz a necessidades fisiológicas e dorme. Prestes a dar à luz o quarto filho, a dona de casa disse estar preocupada. “Vamos fazer o quê? Aqui, a gente só tenta sobreviver. As crianças vivem doentes. O jeito é tentar deixar os meninos, que agora estão sem as aulas, dentro de casa. Mas é muito apertada, eles acabam indo para a rua”, informou Fernanda que, na semana passada, recebeu um kit de higiene pessoal. “O meu maior medo é meus filhos serem infectados. Não temos sequer comida”, revelou Fernanda.

Segundo a moradora do Sá Viana, uma vizinha a três casas da dela pegou o coronavírus e passou para os filhos. “A minha vizinha é empregada doméstica, mas desde março não vai trabalhar. O marido dela também foi dispensado. Tem criança aqui que, mesmo antes do Covid-19, teria morrido devido à insalubridade do bairro, mas essas mortes teriam acontecido em outras áreas, mais próximo ao Rio Bacanga”, concluiu Fernanda.

SES MAPEIA CONTAMINAÇÃO POR BAIRROS

Desde o surgimento do primeiro caso, a Secretaria Estadual da Saúde (SES), tem feito levantamentos diários dos locais onde há confirmações de Covid-19. Porém, a SES, ou outra secretaria, não investiga se há pacientes que moram em áreas de extrema pobreza, ou outros aspectos socioeconômicos. Ou seja, não há nada específico, a partir dos nomes dos bairros, como, por exemplo, se as vítimas do coronavírus estão nas palafitas, ou em casas onde há falta crônica de água, e até mesmo a ausência de esgoto.

AÇÕES DO GOVERNO PARA OS MAIS CARENTES

Mas em meio a tantas dificuldades enfrentadas pelos moradores de bairros populares, e principalmente aqueles que vivem em áreas de extrema pobreza, como as palafitas na Rua Nonato Silva, algumas ações sociais foram tomadas pelo governador Flávio Dino. Entre elas, está a isenção da tarifa de água, durante dois meses, de cliente pessoa física cujo consumo é de até 10 m³ (dez metros cúbicos) por mês de água e esgoto, pessoas que integram o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) e são residentes em município do Programa Mais IDH, e pessoa jurídica em regime de condomínio inserido na Faixa I do Programa Minha Casa Minha Vida.

Cerca de 850 mil clientes da Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) foram beneficiados por meio do Decreto nº 35.679/2020.

TARIFA SOCIAL DE ENERGIA

O Governo também estaria realizando campanha estadual para aumento no número de maranhenses beneficiados pela Tarifa Social de Energia, do Governo Federal. Tem direito aos descontos, de até 65%, os beneficiários de baixa renda que estejam inscritos no CadÚnico, com renda familiar mensal per capita menor ou igual a meio salário mínimo nacional; ou beneficiários do BPC. Os descontos de até 100% são para famílias indígenas ou quilombolas, por faixa de consumo.

SEGURANÇA ALIMENTAR

O governo do Estado informou ao Jornal Pequeno que os 45 Restaurantes Populares do Estado continuam em funcionamento, com previsão de abertura de mais cinco unidades, ainda neste mês. As refeições são servidas em embalagens descartáveis, com manutenção de distância de dois metros na fila e reforço na higienização. Haveria ainda a distribuição de quentinhas à população em situação de rua de São Luís, todos os dias da semana.

Fechar