A Vale está em negociações com o Terminal Portuário de Alcântara, no Maranhão, para aumentar os embarques de minério de ferro para a China. O movimento é adotado em meio às recentes tentativas do gigante asiático de diversificar suas fontes da matéria prima da siderurgia em meio a um aumento na demanda doméstica.
Alcântara oferece um porto de águas profundas que pode abrigar os graneleiros de minério de ferro chamados Chinamax ou Valemax – navios tão grandes quanto alguns arranha-céus que podem transportar muito mais carga do que os navios normais de transporte de minério de ferro.
A Vale está considerando um aumento no uso dos navios depois que a China aprovou no mês passado quatro portos adicionais em sua costa para hospedá-los.
Em junho, a China importou quantidades recordes de minério de ferro para atender a um forte aumento na demanda por produtos siderúrgicos diante do boom de infraestrutura e construção civil do país. Cerca de 60% dessa oferta veio da Austrália e preocupações com a oferta aliadas à forte demanda elevaram o preço do minério para preços acima de US $ 110 por tonelada em julho – um nível não observado desde agosto de 2019.
A operadora privada do terminal de Alcântara, Grão Para Multimodal (GPM), que já tem um contrato de concessão de 25 anos para construir e operar o porto e a nova Ferrovia do Maranhão ligada ao terminal marítimo, está em discussão com a mineradora desde o fim do ano passado para um acordo de take or pay – um contrato que garante uma certa quantidade de produção de minério de ferro – e um certo nível de investimentos de capital. No entanto, esse acordo ainda não avançou.
A Vale havia revelado anteriormente aos investidores que estava interessada no porto de Alcântara, com 25 metros de profundidade (82 pés), embora não fosse a única opção da mineradora para mais instalações portuárias perto de suas operações de mineração no norte do país.
A Vale esperava que o Terminal Marítimo de Ponta da Madeira, também no Maranhão, pudesse ser expandido para embarcar mais minério de ferro. Mas, até agora, o terminal suporta apenas cerca de 200 milhões de toneladas, em comparação com uma meta de 240 milhões de toneladas, incluindo 100 milhões de toneladas de S11D em Carajás (PA).
Juntamente com os resultados da Vale no segundo trimestre, divulgados na semana passada, e seu compromisso de avançar com a expansão da produção no Sistema Norte, as deficiências de capacidade de Ponta da Madeira e os quatro novos portos da China podem mudar o jogo, disse o diretor executivo da GPM, Paulo Salvador.
“Os Valemax da Vale foram criação do Brasil para aproximar suas minas da China. Portanto, as aprovações dos quatro portos profundos são um voto de confiança na capacidade (da Vale) de fornecer minério de ferro de qualidade. Achamos que é importante para a China ter fornecedores diversificados”, afirmou Salvador.
“Acreditamos que seria do interesse da China ter outras opções além do minério de ferro australiano e se tornar menos dependente dele – uma situação que poderia aumentar custos e incertezas nos suprimentos”, completou.
NOVOS TERMINAIS
A aprovação da China de quatro novos portos de atracação há duas semanas para acomodar “transportadores de minério muito grandes”, padrão Chinamax capazes de transportar até 400.000 toneladas de minério – área dominada pela Vale com seus Valemax – foi um sinal crucial de que portos brasileiros como Alcântara poderiam apoiar um comércio maior entre os dois países, acrescentou Salvador.
Os quatro novos terminais chineses estarão localizados nas cidades de Rizhao, Yantai e Lanshan, na província de Shandong, leste da China, e em Sanduao, província de Fujian, no sudeste.
“A China importa 900 milhões de toneladas por ano e o Brasil não está entregando o que deveria, então os preços do minério de ferro (dwt) subiram muito, cerca de 40%, e apresentam custos enormes para as siderúrgicas chinesas”, observou Salvador.
“A demanda chinesa é tão grande que eles estão considerando projetos arriscados na África Ocidental, como Simandou (na Guiné)”, frisou.
O estímulo à infraestrutura na China elevou a demanda e os lucros da Vale e de seus concorrentes – australianas BHP, Rio Tinto e Fortescue – a níveis recordes nos últimos seis meses. Mas China e Austrália travam uma disputa bilateral desde abril, quando Canberra pediu uma investigação internacional sobre as origens do coronavírus. E o suprimento brasileiro é um complemento importante ao minério de ferro australiano para a China, principalmente porque a produção da Austrália está em plena capacidade, disse Erik Hedborg, analista de minério de ferro da consultoria CRU Group.
O Sistema Norte, com uma das maiores reservas de minério de ferro de alta qualidade do mundo, tem potencial para se tornar um recurso essencial de minério de ferro para a China, disse Hedborg. “Para um recurso tão importante, é importante que a China diversifique suas fontes”, avaliou.
O acordo com Alcântara não apenas ajudaria a Vale a reforçar os embarques de minério de ferro do Sistema Norte, mas também poderia acomodar expansões futuras em 50 milhões de toneladas por ano, disse o CRU Group. “Acreditamos que [Alcântara] é uma solução viável para aumentar a capacidade de remessa do Sistema Norte da Vale, que atualmente é apenas o suficiente para lidar com a capacidade instalada de produção. No entanto, para avançar, o projeto dependerá da estratégia de médio e longo prazo da Vale”, disse o analista do CRU Group Eduardo Tinti.
O desenvolvimento de novos portos de profundidade no Brasil chamou a atenção do governo. Na sexta-feira, durante uma reunião virtual com membros do judiciário federal, o ministro da Infraestrutura, Tarcisio Freitas, mostrou seu apoio ao desenvolvimento de Alcântara e saudou seu potencial para aumentar as exportações brasileiras de minério de ferro.
Salvador disse que o compromisso da Vale com Alcântara também aumentaria a capacidade da GPM de garantir mais capital, principalmente de investidores chineses. O terminal precisa de investimentos de cerca de US$ 1,5 bilhão para uma nova ferrovia e porto, com capacidade de 70 milhões de toneladas de minério de ferro e 10 milhões de toneladas de grãos por ano até 2024. Seria necessário mais capital para levar Alcântara a uma capacidade de 140 milhões de toneladas de minério de ferro, 40 milhões de toneladas de grãos e 10 milhões de toneladas de combustíveis e fertilizantes por ano.
Salvador disse que a GPM continuaria com a construção, mas espera a adesão da Vale. A mineradora se recusou a comentar. As informações são do South China Morning Post.