Após repercussão negativa, o Ministério da Educação (MEC) vai revogar a portaria publicada nesta quarta-feira que determina o retorno das aulas das universidades federais, institutos federais e faculdades particulares a partir de janeiro. Uma nota será divulgada explicando a decisão.
A portaria pegou de surpresa as instituições federais, que estão com as aulas presenciais suspensas desde março devido à pandemia do novo coronavírus. A pasta foi criticada por não ter discutido a medida antes com as instituições de ensino e por tê-la tomado exatamente quando o país vive um nova alta de casos e internações, com aumento preocupante da ocupação de leitos na rede de saúde.
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, declarou à CNN Brasil que não esperava tanta resistência. “Quero abrir uma consulta pública para ouvir o mundo acadêmico. As escolas não estavam preparadas, faltava planejamento”, afirmou. O ministro disse também que o governo vai liberar o retorno somente quando as instituições estiverem confiantes.
O epidemiologista Pedro Hallal, reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), criticou a medida, classificando como “ato nulo”:
— As universidades públicas têm autonomia garantida pela Constituição. Com todo respeito, não cabe ao MEC decidir sobre isso. O objetivo da portaria foi jogar os alunos contra as universidades. Com as pausas decorrentes da chegada da pandemia, muitos deles ficaram ansiosos, com a formatura atrasada.
Em nota, Denise Pires de Carvalho, reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), disse que a instituição “seguirá, com muita seriedade e responsabilidade, protegendo a vida da comunidade universitária e não deixará de cumprir, com autonomia, a sua missão institucional”.
A Universidade Federal de Brasília (UnB) emitiu um comunicado em que diz ter recebido com surpresa a publicação da portaria e reitera que não colocará em risco a saúde dos integrantes de sua comunidade. “A prioridade, no momento, é frear o contágio pelo vírus e, assim, salvar vidas. A volta de atividades presenciais, quando assim for possível, será feita mediante a análise das evidências científicas, com muito preparo e responsabilidade”, conclui a nota.
O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) também se manifestou contrário à portaria, em um comunicado intitulado “Governo quer colocar nossas vidas em risco. Não aceitaremos.” A diretoria do Andes considerou a iniciativa da pasta “coerente com a postura negacionista do governo federal” e defendeu que as aulas presenciais só retornem após a vacinação em massa da população.
Reação no Congresso
Parlamentares também criticaram a medida. Em rede social, o deputado federal Idilvan Alencar (PDT-CE) disse que a postura do governo “tem sido fugir da responsabilidade e jogar a culpar nos outros”. Ele avalia que o MEC “faz algo para arrumar confusão e politizar um assunto que deveria ser tratado com base em dados e evidências”.
A portaria é objeto de cinco projetos de decreto legislativo com o objetivo de sustar a norma. Para deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), que entrou com o pedido com outros deputados da bancada, “toda pressão continua necessária”.
Também apresentaram projetos para suspender a medida os deputados: Tulio Gadelha (PDT-PE), Joenia Wapichana (Rede-RR), André Figueiredo (PDT-CE) e Alice Portugal (PCdoB-BA), que assina junto com Maria do Rosário (PT-RS).
Estudantes
Em nota conjunta, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), União Nacional dos Estudantes (UNE) e a Associação Nacional dos Pós-graduandos (Anpg) destacam que “a portaria é uma evidência do descaso e da falta de um acompanhamento sério sobre a situação da educação em tempos de pandemia”.
“A UNE, UBES e ANPG defendem a vida, a educação, a ciência e a Autonomia Universitária, e contrariamente ao que faz Bolsonaro politizando a vacina e dificultando a superação da pandemia, acreditamos que é necessária a construção de uma grande campanha em defesa da vacina”, diz o texto.