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Artigo: Em defesa da Comissão Estadual de Prevenção à Violência

O cumprimento das decisões judiciais não poderia estar submetido aos procedimentos administrativos no âmbito do Poder Executivo

Fonte: Mário de Andrade Macieira e Sálvio Dino de Castro e Costa Junior

Mário de Andrade Macieira

Advogado, Professor da UFMA, Ex-Presidente da OAB/MA

Sálvio Dino de Castro e Costa Junior

Advogado, Professor da Universidade Ceuma, Ex-Secretário de Estado de Justiça e Cidadania e de Direitos Humanos

 

A OAB/MA ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei Estadual 10.246/2015, que criou a Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade – COECV. Em sua inicial, a Ordem argumenta que haveria violação ao princípio da separação dos poderes no prévio estudo e mediação prévia para a execução de mandados de reintegração e manutenção de posse em casos de conflitos fundiários.

Segundo o argumento da OAB/MA, o cumprimento das decisões judiciais não poderia estar submetido aos procedimentos administrativos no âmbito do Poder Executivo, como previsto na referida lei estadual.

Não há, porém, qualquer inconstitucionalidade na Lei Estadual que, inclusive, está de acordo com os princípios constitucionais de proteção aos direitos fundamentais e humanos. Com efeito, já no art. 1º, a Constituição Federal definiu como um dos fundamentos da República a Dignidade da Pessoa Humana, e, no art. 3º, definiu como objetivos fundamentais erradicar a pobreza e a marginalização. No art. 5º, por sua vez, está assegurado o direito à vida, que não se resume ao direito de não ser morto, mas alcança o direito a uma vida digna em que as necessidades básicas da pessoa estejam atendidas. No art. 6º, vê-se o direito à moradia, entre os direitos sociais fundamentais, ao lado da educação, da saúde e ao trabalho, por exemplo. O próprio art. 126 da Constituição determina que os Tribunais de Justiça dos Estados devam criar Varas Especializadas para dirimir conflitos fundiários.

Muito bem, ao determinar que a Comissão Estadual atue previamente à execução forçada, com o emprego de força policial no cumprimento de mandados judiciais para os despejos no campo e na cidade, a lei estadual vai ao encontro de todos os princípios fundamentais acima mencionados, de modo a evitar mortes, prisões, desabrigo e, sobretudo, mais violência. O direito de propriedade, nesse passo, embora de enorme significado e especial proteção, não pode ser visto de modo absoluto, eis que a própria Constituição condiciona o seu exercício ao cumprimento de sua função social.

Nesse sentido, ao emitir o mandado de reintegração e manutenção de posse em ações possessórias, o Poder Judiciário requisita ao Executivo o auxílio da força policial e este, antes do emprego da força, com base na lei injustamente impugnada pela OAB/MA, vai aos locais de modo a buscar uma solução do conflito sem o emprego imediato da força. É justamente o efetivo cumprimento das ordens judiciais o que a lei busca, dando-se ênfase à solução pacífica dos conflitos possíveis de serem evitados. Veja-se, por oportuno, que em seu art. 2º, inciso IV, a lei estabelece que a Comissão Estadual de Prevenção à Violência deve sugerir medidas para assegurar o cumprimento de decisões judiciais com o necessário respeito aos direitos humanos.

Não se vê na lei qualquer impedimento ao cumprimento das decisões. Em verdade, a lei apenas determina que seja estimulada a negociação e o diálogo entre as partes, justamente com o mesmo espírito do vigente Código de Processo Civil que prioriza os meios pacíficos de solução dos conflitos, como a conciliação e a mediação. A vinculação, pois, é ao Poder Executivo, e não ao Poder Judiciário.

Não se vislumbra, sob qualquer ótica, a alegada violação do Princípio da Separação dos Poderes. Ao revés disso, a norma impugnada busca a concretização, no tocante aos conflitos fundiários, do respeito às ordens judiciais mediante esforços que cabem a todos os organismos estatais – Executivo, Legislativo e Judiciário, construindo alternativas pacificadoras dadas as complexas relações de poder existentes na sociedade.

De qualquer modo, a ação proposta pela OAB/MA tem um mérito. Reconhece, tacitamente, que existe no Brasil um importante problema fundiário a ser enfrentado. Melhor seria, nessa linha, fosse questionada a menor aquisição de terras para fins de reforma agrária pelo Governo Federal desde 1995 ou a paralisação de 413 processos de reforma agrária com a interrupção de vistorias e análises sobre desapropriação de imóveis rurais pelo INCRA, o que, sem dúvida alguma, impacta na qualidade de vida do povo maranhense. Ainda há tempo. Fica a dica.

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