A pandemia do novo coronavírus mudou radicalmente a vida ao redor do mundo e, mesmo após a vacinação, analistas esperam mudanças nas tendências de consumo. Um relatório publicado pela consultoria McKinsey prevê que o retorno da confiança do consumidor poderá desencadear um fenômeno chamado de “compra por vingança”, com o aumento de consumo de serviços, principalmente aqueles com elemento comunitário e de contato social, como restaurantes, festivais de música, eventos e viagens.
Para a economista Flávia Ávila, especialista em economia comportamental e fundadora da consultoria InBehavior Lab, haverá um aumento do consumo de experiências ante o consumo de bens materiais. Ela explica que a lembrança de uma viagem ou festival, por exemplo, proporciona um pouco de felicidade ao consumidor toda vez que surge em sua mente. No caso de bens materiais, a satisfação não é tão duradoura.
“A pandemia da Covid-19 nos ensinou a importância de aproveitar o momento, e acumulou um desejo de consumo como busca pelo prazer”, afirma. “Acredito que, como resultado, teremos uma mudança de padrão de consumo e de padrão de vida, aumentando essa busca por experiências.”
Roberto Haro Nedelciu, presidente da Braztoa (Associação Brasileira das Operadoras de Turismo), diz que “viagem de vingança é realmente um movimento observado”. Mas ele, pessoalmente, chamaria de “viagem de desestresse”.
Diferenças de acordo com idade e renda
Esse busca pelo consumo de experiências deve ser diferente de acordo com a faixa etária. “Pessoas mais velhas serão mais exitantes em voltar a circular com tranquilidade, diferentemente de grupos jovens”, diz Ávila.
O futuro do consumo também vai depender das classes sociais. Para Jéssica Vicente, especialista em pesquisa do comportamento do consumidor do Serasa, ainda que a vontade de consumir experiencias como viagens e eventos exista e esteja reprimida e acumulada, para grande parte da população não será possível satisfazer este desejo.
“Existe a necessidade do ponto de vista do indivíduo, mas no Brasil temos média de dívida contínua de quatro dígitos por pessoa. Com o fim do auxílio emergencial e manutenção de fases vermelhas e laranjas, o prognóstico não é positivo”, afirma.
Ela acredita que as pessoas vão gastar com mais cautela e que, antes de optar pelo consumo, os brasileiros irão primeiro pensar em fazer uma reserva de emergência.
Eventos mais caros
Aqueles que trabalham oferecendo serviços também aguardam com otimismo o período pós-pandemia. Doreni Caramori, presidente da Abrape (Associação Brasileira dos Promotores de Eventos), afirma que uma pesquisa realizada pela associação confirma o desejo de consumo de eventos, festas e experiências coletivas.
Porém, a dificuldade do setor será em aumentar a quantidade de eventos oferecidos. O carnaval de 2022, por exemplo, ainda que possa ocorrer, terá a mesma quantidade de dias. “Não vai ter dois carnavais em 2022. Então, por mais que a demanda aumente, o setor não consegue duplicar a oferta.”
Neste cenário, Caramori vê duas possíveis soluções: aumentar o gasto médio dos eventos e explorar mais as noites de sábado e sextas-feira.
“Esperamos esse crescimento, mas o ticket médio também não pode aumentar muito, por conta da barreira de renda dos clientes. Então, por mais que haja mais procura, haverá também um limite para o valor gasto”, diz.
Viagens com grandes descontos
Roberto Haro Nedelciu, presidente da Braztoa (Associação Brasileira das Operadoras de Turismo), diz que, após o último ano em casa, as pessoas estão valorizando cada vez mais o contato e a descoberta de novos locais.
Para atrair ainda mais o consumidor, ele também aposta no crescimento de grandes descontos, como viagens 60% ou 70% mais baratas. “Somado a isso, vemos companhias e hotéis possibilitando remarcação de data com até dois anos, sem custos. Isso nunca existiu antes”, diz.
A partir do momento em que a população vacinada for consideravelmente grande, ele também prevê que os descontos começarão a diminuir.