De zagueiro no Santos a atacante no Tottenham, a história do jogador maranhense na Inglaterra

O menino que saiu de Bom Jesus das Selvas, cidade com pouco mais de 30 mil habitantes, e foi jogar em Londres.

Fonte: Renata Heilborn e Marcelo Courrege

O gol contra o Aston Villa no último domingo foi o primeiro de Carlos Vinicius na Premier League. O décimo pelo Tottenham. O ápice de uma história de altos e baixos. Desde os primeiro passos como jogador, no Santos, o atacante maranhense já jogou no meio, de zagueiro, e, hoje, atua como atacante de um dos maiores clubes da Premier League. O menino que saiu de Bom Jesus das Selvas, cidade no Maranhão com pouco mais de 30 mil habitantes (458 km distante da capital São Luís) foi parar em Londres.

À primeira vista, a trajetória pode parecer comum, mas antes de parar na Inglaterra, o maranhense de 25 anos precisou ser versátil no campo e na vida. Passou por nove transferências, até chegar ao Tottenham Hotspur, onde ele é comandado pelo treinador português mais famoso do mundo, José Mourinho.

– Ele sabe lidar com o vestiário, sabe o que o jogador gosta, sabe levar a gente. E, se o vestiário está com um clima bom, se a gente está feliz, dentro de campo as coisas vão fluir. E ele sabe que isso é importante. O Mourinho está sempre na resenha, pergunta todos os dias como a gente está, como está a nossa família. Ele se preocupa – afirma Carlos Vinicius.

Após o início nas categorias de base do Santos, Carlos Vinicius foi comprado pelo Palmeiras, depois vendido para a Caldense, até parar no Grêmio Anápolis, em 2017. Praticamente sem jogar pelos dois últimos clubes por onde passou no Brasil, Carlos Vinícius chegou a desistir do futebol.

– Quando acabou meu contrato com o Palmeiras a minha vida virou um deserto. Fui para a Caldense e quase não joguei, fui para o Grêmio Anápolis e aconteceu a mesma coisa. Foi uma fase muito difícil na minha vida, na vida da minha esposa, dos meus filhos. Eu não via mais solução no futebol para poder botar o pão na mesa da minha família. Então, um dia, no alojamento do Grêmio Anápolis, eu comecei a chorar, e percebi que eu realmente precisava parar, aquilo não estava me fazendo bem – desabafou Carlos Vinicius.

Quando a decisão de parar estava tomada, Carlos Vinicius recebeu uma chance para recomeçar. Um olheiro do Real Sport Clube, na época na segunda divisão de Portugal, viu o garoto de 1,90 de altura e resolveu oferecer um contrato de um ano para jogar ele jogar no clube de Lisboa.

– Estava tudo certo para eu deixar o futebol. E aí chegou esse olheiro e me perguntou se eu não queria uma oportunidade de disputar a segunda liga do campeonato português. Eu aceitei logo! É a mesma coisa que oferecer água para uma pessoa que está morrendo de sede – disse ao risos o atacante.

Mas a vida na Europa também demorou a deslanchar. Apesar de ter sido o vice artilheiro na primeira competição disputada em Portugal, o Real Sport Clube caiu para da segunda para a terceira divisão. Mesmo com o mal resultado do clube, o Napoli quis apostar no jogador brasileiro, e assinou um contrato de cinco anos com Carlos Vinicius. Mas a parceria não durou muito, e o atacante logo foi emprestado ao Rio Ave. Com 14 gols em 20 partidas, o jogador foi emprestado novamente, dessa vez ao Mônaco, da Ligue 1 francesa, até ter os direitos econômicos comprados pelo Benfica.

– Quando cheguei ao Benfica, vi que eu estava mais do que preparado para despontar como um dos melhores. E, se hoje eu estou na Premier League, no maior campeonato do mundo, é porque todos esses clubes foram importantes na minha carreira – explica Carlos Vinicius, que foi emprestado ao Tottenham em outubro de 2020 por uma temporada e tem o valor de compra fixado em 45 milhões de libras.

Antes de deixar o Benfica, Carlos Vinicius foi treinado por Jorge Jesus, ex-treinador do Flamengo, que hoje está à frente da equipe portuguesa. Já no clube inglês o chefe é José Mourinho, técnico português com mais títulos entre os que estão em atividade. A comparação entre os dois parece inevitável, mas o jogador prefere exaltar o privilégio de poder contar com ambos em sua trajetória.

– Cada um tem suas qualidades, são grandes treinadores. Foi uma honra ter tido a oportunidade de trabalhar com esses dois. Mas meu tempo com o Jorge Jesus foi muito pouco. Fizemos uma pré-temporada e dois jogos. Mas logo você entende que o Jorge Jesus não foi campeão como foi no Brasil à toa. Só que por outro lado eu tenho o Mourinho que foi campeão de tudo, e fez o que fez pelo futebol. Não cabe a mim dizer quem é o melhor.

Carlos Vinicius se mudou para a Inglaterra com a mulher e os dois filhos. A chegada a um país diferente nunca é fácil, mas foi em solo inglês que ele descobriu num novo companheiro de clube uma extensão de sua família.

– O Lucas Moura foi um presente de Deus na minha vida. Tem gente que brinca que onde o Lucas está, eu estou também (risos). Quando eu cheguei a Londres, fiquei no hotel do clube nos primeiros três dias e aí o Lucas nos convidou para ficar na casa dele. Ficamos lá até arrumar minha casa. Ele e a esposa dele nos trataram super bem. Ele é meu tradutor, professor, amigo, tudo. Por aqui, quem me socorre é ele. – disse Carlos Vinicius, que recebeu uma assistência do amigo Lucas para marcar pela primeira vez na Premier League.

Com dez gols pelo Tottenham, o atacante brasileiro convive diariamente com uma missão difícil: ser o substituto imediato de Harry Kane, um dos melhores centroavantes do mundo. A partida de domingo, contra o Aston Villa, foi a primeira em que os dois foram titulares juntos. Isso não parece o incomodar. Carlos Vinicius garante que no momento só pensa num futuro a curto prazo e quer brigar para trazer um título para o time do norte de Londres.

– O Kane é um grande atacante, uma grande pessoa. Ele sempre está por perto, se preocupa. E eu procuro analisar o que ele faz nos treinos, nos jogos, a forma como ele se posiciona. Estou ali perto de um dos três maiores atacantes do mundo. E, se é pra jogar cinco minutos, vou desfrutar desses 5 minutos. Se é pra jogar 90 minutos, vou aproveitar igual. Porque não tem como estar na maior liga do mundo, estar em um dos maiores clubes do mundo, e ficar triste porque não joguei.

Fechar