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A caprinocultura brasileira

Entrevista com o zootecnista Bruno Biagioli Zootecnista e possui mestrado e doutorado em produção animal pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP, Campus de Jaboticabal. Atualmente é assistente acadêmico na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP, Campus de Jaboticabal e tem vasta experiência em caprinocultura. Foto: Unsplash Nossa entrevista  com Bruno Biagioli, zootecnista […]

Fonte: Scot Consultoria

Entrevista com o zootecnista Bruno Biagioli

Zootecnista e possui mestrado e doutorado em produção animal pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP, Campus de Jaboticabal. Atualmente é assistente acadêmico na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP, Campus de Jaboticabal e tem vasta experiência em caprinocultura.

Foto: Unsplash

Nossa entrevista  com Bruno Biagioli, zootecnista com vasta experiência em caprinocultura, que nos contou um pouco sobre a produção de caprinos no Brasil e quais as perspectivas para esse mercado.

 

Scot Consultoria: Como se encontra atualmente o setor de caprinocultura no Brasil?

Bruno Biagioli: Segundo dados do IBGE (2019) e do Centro de Inteligência e Mercado (CIM) de Caprinos e Ovinos, o rebanho nacional concentra-se na região Nordeste do Brasil, onde agrupa-se 94,5% dos animais.

Os efeitos da pandemia também se aplicam à caprinocultura, com a redução de mercados consumidores (bares, restaurantes, turismo, hotéis, feiras comerciais e exposições) devido à paralisação de estabelecimentos, o que gerou impactos sobre a operação de frigoríficos, abatedouros e laticínios. A comercialização de caprinos para abate é afetada principalmente pelo turismo e fechamento de feiras de venda de animais, e se tratando de laticínios, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) no Nordeste é um grande consumidor de leite caprino e devido à suspensão do funcionamento das escolas e o alto grau de incertezas quanto às medidas governamentais (federal, estadual e municipal) torna-se incerta a venda de lácteos. Já em regiões do Sudeste, a diminuição do turismo é que afeta negativamente a comercialização. Alguns produtores independentes investiram na venda de lácteos, leite e queijos ao consumidor final, o que fez com que essas perdas fossem minimizadas.

Os dados mostram que o rebanho de caprinos no Brasil cresceu 36,8% no período entre 2017 e 2019, mas, com a pandemia, esse cenário de crescimento é incerto.

Scot Consultoria: Na caprinocultura, se destaca mais a produção de carne ou de leite?

Bruno Biagioli: Tratando-se de caprinos, existem polos de produção de animais leiteiros e polos de produção de animais destinados ao abate, sendo que, com quase 95% do rebanho nacional localizado na região Nordeste, as características regionais impactam muito no cenário nacional.

Entre os estados, a Bahia ocupa o primeiro lugar em efetivo de rebanho caprino, 31% do rebanho nacional. Em seguida, destaca-se os estados de Pernambuco, Piauí, Ceará e Paraíba, respectivamente com 22,98; 16,59; 10,02 e 6,13% do total de animais. Os três maiores rebanhos de caprinos localizados fora da região Nordeste encontram-se nos estados do Paraná (0,91%), Pará (0,72%) e Minas Gerais (0,68%), com destaque para rebanho caprino leiteiro de Minas Gerais.

Com relação ao abate de caprinos, existe ainda muita informalidade, mas os dados de venda de caprinos, que não são necessariamente somente animais destinados ao abate, podendo haver animais destinados à produção leiteira, indicam que Bahia, Pernambuco e Piauí, são os estados que mais comercializam caprinos no Brasil.

Segundo dados do IBGE de 2017, os estados com a maior quantidade produzida de leite de cabra são Paraíba com 21,08%, Bahia com 20,47%, Minas Gerais com 15,70% e Pernambuco com 13,64% do total produzido. Destacam-se nesses números que, apesar de Minas Gerais possuir 0,68% do total do rebanho nacional, é o terceiro em produção de leite, o que pode indicar animais mais produtivos, sistemas de produção mais especializados e mão de obra mais qualificada, mas não que isso não ocorra nos outros estados.

Scot Consultoria: Considerando a caprinocultura, a cadeia de produção de leite ou a de carne possui uma estruturação mais organizada?

Bruno Biagioli: Ambos os setores têm problemas. Como a produção possui polos, alguns desses polos são mais organizados, outros menos.

Vamos analisar como exemplo, a bacia leiteira de caprinos que compreende as regiões do Cariri Paraibano, Sertão e Agreste Pernambucanos, considerada a maior bacia leiteira do país. Grande parte da produção está organizada localmente em cooperativas e associações de produtores, que atuam na produção, beneficiamento e comercialização dos produtos, sendo que o destino de boa parte desses produtos são programas governamentais, como por exemplo, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). No meu ponto de vista, existem muitos pontos positivos, como a organização dos produtores, que acarreta em maior informação e assistência técnica, mas o grande problema é a dependência de programas governamentais.

No Sudeste não existem, até onde eu sei, programas governamentais. Então os produtores tendem a trabalhar de forma individual, sendo o produtor responsável por produzir, processar, vender e entregar os seus produtos, tornando uma tarefa bastante desafiadora. Existem laticínios que compram leite de produtores terceiros, o que facilita e organiza a produção. Da mesma forma que no Nordeste existem aqueles produtores independentes que possuem sua marca própria.

Com o abate, a situação é um pouco mais complicada. Existem grandes polos no Nordeste, cuja cadeia de comercialização de carne é bastante organizada e fiscalizada pelos órgãos sanitários, como nas cidades de Tauá e Caruaru no Ceará e a região do Vale do Jacuípe e Juazeiro na Bahia. Ainda assim, existe muito abate clandestino.

É muito difícil, num país do tamanho do Brasil, fazer generalizações, por isso a caracterização de cada polo produtor é importante.

Scot Consultoria: Bruno, o Brasil é caracterizado como uma produção de “fundo de quintal” quando falamos em produção de caprinos?

Bruno Biagioli: “Fundo de quintal” não é a melhor forma de descrever a produção de caprinos no Brasil. Existem tecnologias, genética, processos cuidadosos e produtos de primeira linha ganhadores de prêmios internacionais, como é o caso do Capril do Bosque, em Joanópolis/SP, que ganhou prêmios nacionais e internacionais devido à qualidade de seus queijos.

Da mesma forma que existem produtores de gado de corte, bovinos leiteiros, de suínos e aves que não respeitam os animais e colaboradores, não se preocupam com o ambiente, não controlam seus gastos, a caprinocultura é da mesma maneira, porém com muito menos recursos financeiros envolvidos.

Tem muito o que melhorar, sim; existem produções e produtos de primeira linha, com certeza.

Scot Consultoria: No setor brasileiro, quais são os principais entraves e gargalos para o desenvolvimento dessa atividade?

Bruno Biagioli: A caprinocultura comercial é uma cultura nova no Brasil. Os primeiros animais importados de alta produção começaram a chegar no Brasil em 1970, as primeiras leis de regulamentação de produtos lácteos, somente em 1988. Em 2000, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) publicou a Instrução Normativa nº 37 (Brasil, 2000), na qual estabeleceu requisitos mínimos de qualidade do leite caprino destinado ao consumo humano, normatizando seu beneficiamento. Em 2004, foi instalada a Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Caprinos e Ovinos, cuja missão é atuar como foro consultivo, articular agentes públicos, definir ações prioritárias e integrar os diferentes segmentos produtivos da caprino-ovinocultura. Isso demonstra o quão nova é a criação de caprinos de forma comercial e moderna no Brasil.

Existem tecnologias, genética, processos cuidadosos e produtos de primeira linha, mas o mercado consumidor ainda é muito restrito.

Como gargalos, eu vejo como:

– Falta de coordenação e cooperação da cadeia produtiva, integrando pequenos produtores às pequenas e médias usinas beneficiadoras de leite caprino;

– A caprinocultura não ser a prioridade na propriedade ou para o proprietário/produtor;

– Mercado consumidor restrito e produtos com oferta sazonal;

– Acesso a informações técnicas por parte dos produtores.

Scot Consultoria: Quais são as perspectivas para esse mercado no Brasil para os próximos anos? Acredita que o Brasil possa chegar em níveis neozelandeses nos aspectos: manejo, logística e produção?

Bruno Biagioli: Eu, particularmente, acredito muito na caprinocultura brasileira. Temos tecnologia, manejo, genética, conhecimento e mercado para crescer, e o principal, pessoas comprometidas e corajosas.

Claro que temos entraves burocráticos e logísticos, acho que são os principais, mas são superáveis com persistência e perseverança. Novas leis e regras para regulamentação de produtos artesanais e identificação de origem podem ajudar no processo de crescimento da caprinocultura, principalmente a leiteira.

Quanto a comparações com outros países, são questões climáticas, mercadológicas, culturais etc., que nos diferenciam e muito daquele país. Mas os neozelandeses são excelentes produtores de pequenos ruminantes, temos que nos inspirar naquele país e buscar soluções que caibam nas nossas condições e as que não cabem, podemos tentar adaptá-las ao nosso país.

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