Há anos, a ativista Amika Georgia, moradora de Londres (Inglaterra), lançou uma campanha contra a “pobreza menstrual” – termo que, no Maranhão, até poucas semanas atrás não era empregado nas discussões sobre desigualdade social. Por dois anos, a jovem Amika mobilizou ativistas pelos direitos das mulheres, criou petições, e reforçou uma onda que começou a fazer diferença a partir de março de 2019, quando o governo inglês fez seu primeiro anúncio de distribuição de absorventes para escolas secundárias e instituições de ensino superior na Inglaterra.
No Brasil, desde 2018, existem projetos como o “Tô de Chico” que arrecadam doações de absorventes para mulheres em situação financeira vulnerável, sejam elas estudantes ou moradoras de ruas. Mas, foi agora, depois de quase dois anos de pandemia de Covid-19, que o problema da pobreza menstrual “se tornou visível” ao Maranhão. E, felizmente, a partir dessa sexta-feira (15), cerca de 163 mil estudantes da rede pública do estado passarão a receber absorventes gratuitos.
Amika Georgia tinha 17 anos quando leu uma notícia que a chocou: “uma em cada dez britânicas entre 14 a 21 anos não tinham condições de comprar absorventes íntimos e 49% já teriam deixado de ir à escola por estarem menstruadas.
Já em São Luís, nessa sexta-feira, durante evento que deu início à distribuição de absorventes, o titular da Secretaria da Educação do Maranhão (Seduc), o professor Felipe Camarão, informou que a pobreza menstrual atinge cerca de 25% de quase 200 mil alunas da rede pública de ensino maranhense. O público perderia até 40 dias de aula, por ano, devido à pobreza menstrual.
Os dados repassados por Felipe Camarão são novos, ou pelo menos nunca antes teriam sido informados à imprensa. Entretanto, o problema seria antigo. A gestão da escola que sediou o evento de ontem, o Centro Educa Mais Dorilene Silva Castro, localizada na Travessa Dom Pedro 2, na Vila Conceição, bairro do Polo Coroadinho, enfatizou que sempre existiram casos de alunas que ficavam menstruadas no horário escolar, e pediam para voltarem para suas casas, devido à falta do absorvente.
Para o secretário da Seduc, distribuir absorventes “é um ato de ‘humanidade’, ‘carinho’, afeto”.
Para a diretora do Dorilene Silva Castro, Maria Luiza da Silva, é uma forma de acabar com a evasão escolar. “Temos 128 estudantes mulheres nesta escola, que está dentro de um bairro de alta vulnerabilidade socioeconômica. Aqui acontece demais, as meninas menstruam e pedem para sair (saírem da aula)”, disse Maria Luiza, que é gestora escolar nos últimos oitos anos, desde que o Centro Educa Mais Dorilene Silva Castro foi fundado.
A campanha liderada pela jovem inglesa Amika ajudou a popularizar a hashtag #freeperiod (menstruação livre) e mostrou que a questão é um fator de exclusão que extrapola as barreiras entre países pobres e ricos. Desde 2019, estudos socioeconômicos já estimavam que metade da população feminina de países em desenvolvimento – isto engloba o Brasil, e, principalmente, o Maranhão, pois o estado teria um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) de 2021, perderia apenas para o estado do Alagoas – fosse afetada pela falta de acesso a produtos para o período menstrual.
Como alternativa à falta de absorvente, existiriam casos pelo Maranhão afora de mulheres que usam panos, meias, papel higiênico, jornal. Ainda durante o evento de início da distribuição dos absorventes pelo governo do Estado, uma estudante, identificada como Mailana dos Reis, disse já ter passado por situação de falta de produtos para menstruação.
“Não somente eu, mas outras mulheres da minha família, inclusive minha mãe. De haver dias em que um pano era utilizado para aparar o sangue da menstruação. Absorvente não é questão de luxo, é necessidade básica”, relatou Mailana.
ABSORVENTES GRÁTIS
A ação do governo do Estado visa combater a chamada pobreza menstrual, que afeta estudantes de famílias com baixo poder aquisitivo, por conta da carência de acesso a produtos para uma boa higiene no período da menstruação.
Serão distribuídos oito absorventes higiênicos por mês para cada estudante, totalizando 1,3 milhão de itens distribuídos mensalmente, por um período de 12 meses.
“A pobreza menstrual atinge cerca de 25% de quase 200 mil meninas, que estudam na nossa rede, e que perdem até 40 dias de aulas por ano. Esta é uma realidade que fica para atrás. E, a partir de hoje (ontem) também, eu tenho a honra de anunciar que nas próximas aquisições a Seduc terá parceria com o Sistema Penitenciário, por meio da Secretaria de Administração Penitenciária. Além de uniformes e carteiras escolares que adquirimos do sistema prisional, nós também vamos adquirir absorventes que serão destinados às nossas escolas da rede pública estadual”, disse Camarão.