A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, com 39 votos favoráveis, dois contrários e uma abstenção, a admissibilidade da PEC 163/12, que proíbe a concessão de aposentadoria a magistrados como medida disciplinar. O objetivo é acabar com a pena de aposentadoria compulsória com salário proporcional ao tempo de serviço, aplicável a juízes acusados de atos de corrupção ou ofensivos à moralidade administrativa.
A proposta foi apresentada pelo deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR) e pelo ex-deputado Arnaldo Jordy. Para Bueno, a medida acaba com um privilégio. “Há uma preocupação muito grande da esmagadora maioria dos juízes brasileiros por esse absurdo da aposentadoria compulsória. Sentem-se constrangidos de ter uma meia dúzia de juízes punidos e sendo pagos pelo resto da vida com dinheiro público pelo crime que cometeram. Ou seja, o crime compensa”, afirmou o deputado.
A proposta prevê a pena de perda do cargo para juízes que atentarem contra a dignidade, a honra e o decoro de suas funções. E atribui ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a competência de decretar, por decisão administrativa, a perda do cargo de membros do Poder Judiciário. Atualmente, a exoneração de um juiz só pode se dar por decisão judicial transitada em julgado.
O parecer do relator, deputado Kim Kataguiri (União-SP), foi pela admissibilidade do texto. “Não há vício de inconstitucionalidade formal ou material na proposta, bem como foram atendidos os pressupostos constitucionais e regimentais para sua apresentação e apreciação”, diz o parecer. “O que discutimos aqui com muita clareza é se a lei vai continuar a ‘punir’ juízes corruptos com férias permanentes e vencimentos de R$ 38 mil em média ou se a gente vai passar a fazer justiça? ”, questionou. Ele citou levantamento da imprensa segundo o qual 47 juízes aposentados compulsoriamente custarão aos cofres públicos cerca de R$ 47 milhões.
Divergências
O deputado Valtenir Pereira (MDB-MT) apresentou voto em separado pela inadmissibilidade da proposta e pediu retirada de pauta da PEC. Para ele, o texto tem vício de iniciativa, já que a Constituição Federal determina que lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disponha sobre o Estatuto da Magistratura, incluindo direitos, prerrogativas e garantias dos juízes.
Pereira acrescentou que o cargo de magistrado deve ser vitalício, para garantir a autonomia no exercício de sua atividade. “O que restaria de sentido à garantia da vitaliciedade, em sendo possível a perda do cargo por decisão administrativa? Nada, pois os juízes gozariam de estabilidade na mesma medida conferida a todo e qualquer servidor público. A previsão constitucional da vitaliciedade esvaziar-se-ia de qualquer sentido e consequência prática”, avaliou.
Com argumentos semelhantes, o deputado Tadeu Alencar (PSB-PE) também pediu retirada de pauta da proposta e que fosse realizada audiência pública sobre o tema. Ele afirmou que, conceitualmente, é favorável à discussão da PEC, porque um juiz corrupto merece ser extraído do serviço público e não deve receber remuneração como prêmio. Porém, ressaltou que bons juízes que contrariam interesses poderosos são alvo de perseguição, e a regra prevendo que o cargo de juiz é vitalício surgiu para evitar isso. Para ele, a PEC altera de forma “oblíqua, transversa” essa regra do estatuto da magistratura, sem que essa mudança tenha sido iniciativa do Supremo Tribunal Federal.
Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) concorda que, sem a garantia da vitaliciedade, os magistrados não terão independência para julgar. Segundo ele, apenas 58 juízes brasileiros de cerca de 14 mil foram aposentados compulsoriamente nos últimos dez anos. “Menos do que 0,01%. Nós estamos atacando um instituto que protege 99,9% dos bons juízes”, afirmou.
Defesa da matéria
Deputados da oposição e do governo defenderam a admissibilidade da PEC. Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), a proposta não fere nenhuma clausula pétrea da Constituição e dialoga com o sentimento da sociedade, que não suporta mais os privilégios naturalizados. “Se há postura contra o decoro, a dignidade, o exercício da função, se há o fio da parcialidade tecendo a toga, não há que se ter o tratamento em que esse juiz não seja punido. Se a ele cabe o benefício da aposentadoria, ele está sendo premiado pelo crime que cometeu. É o benefício da impunidade”, avaliou.
“Estamos falando aqui de uma premiação que se dá a poucos e perigosos magistrados”, afirmou a deputada Bia Kicis (PL-DF). “Pessoas de bem se sentiriam constrangidas de ficar afastadas recebendo remuneração. Mas, quando a pessoa já virou marginal, para ela é um prêmio sim não fazer nada e receber polpudas remunerações”, completou. Ela acredita que as entidades representativas dos magistrados devem ser ouvidas, e o texto pode ser aperfeiçoado na comissão especial.
A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) reiterou que, pela regra atual, a conduta desonesta é premiada com aposentadoria compulsória e remunerada, e quem paga é a população. Ela acrescentou que o Poder Judiciário brasileiro é um dos mais caros do mundo e leva 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB).
“Não há dúvida de que há a expectativa do povo brasileiro de que esse tema seja tratado pelo Congresso Nacional”, avaliou o presidente da CCJ, Arthur Oliveira Maia (União-BA). “Não há dúvida de que o adjetivo que mais caracteriza essa PEC é a moralidade”, completou. Ele acredita que a PEC é a favor do Judiciário brasileiro, já que poucos juízes aposentados compulsoriamente maculam a imagem do conjunto da categoria.
A PEC será submetida agora a uma comissão especial, que avaliará o mérito, e ao Plenário, última etapa da tramitação.