Gustavo Moreno/SCO/STF
José Higídio
O Plenário do Supremo Tribunal Federal iniciou nesta sexta-feira (10/5) o julgamento sobre a possibilidade de a polícia requisitar ao Ministério Público a antecipação de produção de provas em casos de violência contra crianças e adolescentes. O fim da sessão virtual está previsto para a próxima sexta (17/5).
A análise diz respeito ao parágrafo 1º do artigo 21 da Lei Henry Borel, de 2022, que passou a prever essa hipótese. O trecho da norma é contestado pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp).
De acordo com a entidade, o termo “requisitar” significa “determinar” e isso inverte a lógica acusatória, pois é o MP quem tem função de requisitar diligências policiais. Para a Conamp, o MP não pode ser submetido a uma ordem da polícia.
Até o momento, o ministro Luiz Fux, relator do processo, foi o único a se manifestar. Ele votou por estabelecer que o delegado pode apenas solicitar que o MP proponha ação cautelar de antecipação de produção de prova em casos do tipo. Segundo o magistrado, o MP tem a prerrogativa de avaliar se é o caso de atuar nesse sentido ou não.
Voto do relator
Fux explicou que a autonomia do MP é garantida pela Constituição e, por isso, não pode ser restringida pela legislação infraconsticucional: “A atuação dos membros do Ministério Público não admite balizas jurídicas à sua independência funcional que não estejam previstas no sistema constitucional de responsabilização”.
Na prática, isso significa que uma lei não pode dar a um órgão o poder ou a atribuição de determinar que o MP proponha uma ação. O magistrado lembrou que o ajuizamento da ação penal e da ação cautelar de produção de provas é função institucional do MP.
O relator também apontou que as funções da polícia judiciária (que inclui as Polícias Civis e a Polícia Federal) “não incluem a de determinar atuação do Ministério Público, como ao se exigir a propositura de ação cautelar de produção de provas”.
Ele também destacou que o MP é o responsável pelo controle externo da atividade policial. Assim, atribuir à polícia o controle externo do MP “subverteria o desenho constitucional de ambas as instituições”.
O ministro afirmou que o verbo “requisitar” pode ter o sentido de “pedir”, em vez de “determinar”. É usado neste sentido, por exemplo, no § 1º do artigo 100 do Código Penal, segundo o qual a ação penal pública depende de representação do ofendido ou de “requisição” do ministro da Justiça.
“Apesar de se utilizar o termo ‘requisição’, a compreensão tem sido de que o vocábulo denota, em sua compreensão jurídica, uma autorização ou pressuposto para atuação ministerial, jamais como uma ordem dirigida ao titular da ação penal pública”, explicou.
Por outro lado, o verbo “requisitar” de fato tem sido usado, “ao menos no âmbito processual penal”, com o sentido de “determinar”, para diferenciar a determinação funcional de um pedido ou uma solicitação — geralmente representados pelo verbo “requerer”.
Por isso, Fux considerou importante dar ao termo da lei o sentido de “solicitar”. Para ele, isso preserva a autonomia constitucional do MP e “mantém a ideia legislativa de se possibilitar a provocação da polícia judiciária para a coleta cautelar de provas”.