As alterações propostas pelo governo Lula (PT) nas regras de acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) têm enfrentado forte resistência no Congresso Nacional, especialmente entre parlamentares do Nordeste. A principal preocupação é o impacto direto na economia de municípios da região e o aumento da pobreza com a exclusão de beneficiários.
O BPC, que funciona como uma espécie de aposentadoria não contributiva para idosos de baixa renda e pessoas com deficiência em situação de vulnerabilidade, é uma política social crucial para muitas famílias brasileiras. No entanto, com as novas regras, a estimativa é que cerca de 720 mil pessoas em todo o país possam perder o benefício, sendo 229,69 mil no Nordeste.
Ponto central das críticas: o cálculo da renda per capita
O foco das críticas é o artigo 9º do projeto, que altera dispositivos da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) e do Estatuto do Idoso. As mudanças propõem que o valor recebido pelo BPC passe a ser incluído no cálculo da renda per capita das famílias, impedindo o acúmulo de benefícios em lares com mais de um beneficiário. Segundo especialistas, essa alteração é vista como uma das medidas mais rigorosas do pacote de ajuste fiscal.
A Rede Observatório do BPC estima que essas mudanças poderiam representar uma redução de R$ 13,03 bilhões nos repasses aos municípios, afetando diretamente a economia local. No Nordeste, deputados e senadores têm se mobilizado para revisar o texto. “Esses benefícios são vitais para a sobrevivência de muitas famílias em nossa região. Não podemos aceitar cortes que agravem a pobreza”, afirmou o deputado Florentino Neto (PT-PI).
Reações no Congresso e impacto político
O deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) classificou a proposta como um “ataque aos mais vulneráveis”, destacando que dois em cada três aposentados no interior do Ceará dependem do BPC. “Se houver mais de um beneficiário na casa, o benefício será cortado. Isso é inaceitável para quem conhece a realidade dessas famílias”, criticou.
Parlamentares do PT também se posicionaram contra a medida. Patrus Ananias (PT-MG) defendeu uma revisão do texto para preservar o benefício, enquanto o senador Ciro Nogueira (PP-PI) afirmou que não apoiará mudanças no Senado.
Até mesmo a federação PSOL-Rede é contra as alterações, apontando que a proposta prejudica diretamente os mais pobres e acelerou a tramitação do projeto na Câmara sem um debate amplo.
O governo defende a proposta
Por outro lado, o governo justifica as mudanças como uma tentativa de equilibrar as contas públicas, estimando uma economia de R$ 12 bilhões até 2030. Para o ex-presidente do INSS, Leonardo Rolim, a medida é “corajosa” e aborda problemas estruturais na concessão do benefício. “Essa proposta ataca questões que têm levado ao aumento no número de concessões do BPC”, afirmou Rolim, embora reconheça o desafio de aprovação no Congresso.
O Ministério da Fazenda sinalizou abertura para ajustes. Durante um evento com a Frente Parlamentar do Empreendedorismo, o secretário-executivo Dario Durigan admitiu a possibilidade de alterações na proposta, mas não detalhou quais seriam os ajustes.
O futuro do BPC em discussão
Enquanto o debate continua, a inclusão de novos critérios para cálculo de renda familiar e classificação de deficiência tem gerado apreensão em estados como Ceará e Piauí, onde a dependência do BPC é elevada. Críticos destacam que o corte de benefícios poderá impactar duramente as comunidades mais vulneráveis.
A pressão parlamentar e o alto custo político de mexer no BPC indicam que o governo poderá enfrentar dificuldades para avançar com a proposta em sua forma original. Até lá, a resistência cresce, especialmente em regiões que consideram o benefício indispensável para combater a pobreza e sustentar a economia local.