A inadimplência empresarial no Brasil atingiu níveis recordes em 2024, com cerca de 7 milhões de empresas enfrentando dificuldades financeiras, quase um terço de todas as companhias do país, segundo dados do Serasa Experian. Esse cenário foi agravado pelo aumento da taxa Selic e pela valorização do dólar, fatores que pressionaram ainda mais a capacidade das empresas de honrar seus compromissos financeiros. Em outubro, apenas um mês após o reajuste da Selic em setembro, 100 mil novas empresas entraram para a lista de inadimplentes, rompendo uma estabilidade que durava cinco meses.
De acordo com Luiz Rabi, economista-chefe do Serasa, a combinação de juros elevados e inflação crescente continuará pressionando a inadimplência nos próximos trimestres. O cenário se agrava com a escalada de 27,6% do dólar em 2024, impactando significativamente as grandes empresas que possuem dívidas em moeda estrangeira. Um levantamento da Elos Ayta Consultoria revelou que, até setembro, 40% da dívida total de 101 empresas de capital aberto estava atrelada ao dólar, representando R$ 353 bilhões. No quarto trimestre, com o dólar ultrapassando R$ 6, essa dívida subiu para R$ 392 bilhões, aumentando as despesas financeiras dessas companhias.
Esse contexto deve se agravar ainda mais em 2025, com projeções de que a Selic atinja níveis entre 14,5% e 15,25% ao ano. Fernando Honorato, economista-chefe do Bradesco, alerta que um juro real de até 10% exigirá ajustes operacionais severos por parte das empresas, incluindo cortes de custos e demissões, enquanto o crédito bancário se tornará ainda mais caro e escasso.
As consequências já estão se refletindo em pedidos de recuperação judicial e extrajudicial, que bateram recordes em 2024. De acordo com o Serasa, 1,7 mil empresas recorreram à recuperação judicial até setembro, um aumento de 73% em relação ao mesmo período de 2023. Entre as companhias que optaram pela recuperação extrajudicial, o valor total dos pedidos alcançou R$ 31 bilhões, mais de 300% acima do registrado no ano anterior. Nomes como InterCement, Casas Bahia e Tok&Stok estão entre as empresas que buscaram essa alternativa para evitar o colapso financeiro.
A maior parte das empresas inadimplentes é formada por micro e pequenas empresas, mais vulneráveis às oscilações econômicas. Contudo, médias e grandes empresas também enfrentam dificuldades, especialmente aquelas com alta alavancagem e dívidas em moeda estrangeira. Ricardo Teixeira, professor da FGV, ressalta que o impacto do endividamento elevado não se limita às empresas, mas pode ser repassado ao consumidor por meio de preços mais altos, afetando as vendas e pressionando ainda mais a economia.
Apesar do crescimento econômico registrado em alguns setores, o aumento do custo do crédito e a instabilidade econômica mantêm as perspectivas sombrias para 2025. Ricardo Knoepfelmacher, consultor especializado em reestruturação empresarial, prevê um ano difícil para empresas com alta alavancagem, muitas das quais enfrentarão renegociações forçadas ou até mesmo falências. Para ele, o ambiente atual reflete os desafios de uma política monetária contracionista combinada com um juro real elevado, limitando a capacidade de investimento e expansão das companhias.
Com a dívida média das empresas alcançando R$ 22.417,20 em outubro — o maior nível da série histórica do Serasa —, o cenário exige atenção e estratégias de sobrevivência mais robustas. No entanto, a recuperação dependerá de um ajuste fiscal efetivo por parte do governo, capaz de reconquistar a confiança do mercado e conter o avanço dos juros, criando condições para um ambiente econômico mais estável e previsível.