Vinho desalcoolizado pode oferecer o benefício dos polifenóis das uvas, sem os malefícios do álcool.
Um amigo enviou uma pesquisa de brasileiros publicada em uma das revistas científicas mais importantes com o título que assim traduzi para o português: “Impacto de polifenóis do vinho no perfil inflamatório de Periodontites Apical induzidas em ratos” de Ricci et al. (J Endod 2025;51:594–601). A partir dos critérios e métodos aplicados, houve uma redução significante da inflamação com o uso de vinhoquando comparado com o grupo controle e grupo de solução alcoólica de lesões em animais que receberam solução alcoólica e água.
O amigo enviou uma legenda no pdf com uma sutil provocação dizendo: “- Olha o vinho …”. Não tenho, pessoalmente, nada contra as bebidas alcóolicas, mas, como pesquisador, patologista e profissional da saúde, as bebidas alcoólicas sempre me interessaram gerando investigações e orientações de mestrados e doutorados sobre o assunto. A carcinogênese química bucal é muito rica e demonstrativa de como precisamos mudar nossos hábitos. Deveríamos, a sociedade, saber mais sobre o que colocamos na boca.
ALCOOL E CÂNCER
E a cada dia que passa, se comprova de forma redundante,que em qualquer dose ou frequência, as bebidas alcoólicasaumentam a chance de se desenvolver vários tipos de cânceres em humanos. Mas, é muito difícil mostrar que um determinado produto, vício ou condição disseminada e aceita socialmente, esteja relacionado com um aumento crescente de casos de cânceres na população mundial. Istofaz parte de nossa função na sociedade que nos financia para estarmos sempre vigilantes para ela e avançar no conhecimento.
As pesquisas que revelam esta associação bebidas alcoólicas e câncer são epidemiológicas e laboratoriais e cada vez maisdemonstram como o álcool atua no desenvolvimento do câncer. Esta semana uma pesquisa envolvendo 2,5 milhões de pessoas com idade média de 57 anos, acompanhadas por 16 anos, revelaram de novo que quem consome o álcool estámais exposto ao desenvolvimento do câncer em várias partes do corpo, mas desta vez se observou uma peculiaridade não detectada anteriormente.
O câncer de pâncreas é muito rápido e o prognóstico muito difícil pela brevidade da evolução dos casos clínicos. Entre os 10.067 mil casos de câncer de pâncreas que se apresentaram neste período, foi detectado que tem relação com o consumo de bebidas alcoólicas, mesmo que em doses moderadas, especialmente com a cerveja e destilados, e um pouco menos com o consumo de vinho.
Esta pesquisa feita em residentes da Europa, América do Norte, Austrália e Ásia, também detectou a relação da bebida alcoólica com vários tipos de cânceres como mama, colorretal, esôfago, laringe, fígado, boca e garganta. Outros fatores também contribuem consideravelmente com o aparecimento destas neoplasias malignas como fatores genéticos, histórico familiar e dieta. Os detalhes da pesquisa foram publicados na PSoL Med por Naudin et al.(https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1004590). É importante ressaltar que as causas do câncer se somam, ele é o resultado de um somatório de causas.
VOLTANDO AO AMIGO
Diante do envio do pdf pelo amigo e sua irônica legenda, imediatamente me ative a lê-lo atentamente, para assim responder. – Caro amigo, fique mais atento, o vinho mais bem avaliado na pesquisa é “desalcoolizado”. Uma linha desta bebida sem álcool ou com um mínimo inferior a 0,5%, é largamente comercializado na internet, o quepermitiu aos autores analisar o papel dos polifenóis das uvas no processo inflamatório periapical.
REFLEXÃO FINAL
Temos que acreditar no ser humano: quando ele quer faz coisas que todos duvidam, tal como resgatar o prazer de tomar vinho se livrando dos efeitos maléficos do álcool, eliminando-o de sua composição final. Brindemos?