
A Câmara dos Deputados deve retomar em 2026 a análise de um projeto de lei que busca impedir o uso da constelação familiar em qualquer instância do Poder Judiciário, inclusive como método alternativo de resolução de conflitos. A proposta avançou nas comissões temáticas da Casa e aguarda agora exame da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), última etapa antes de seguir para o Senado.
O projeto de lei 2166/24, de autoria do deputado Duda Ramos (MDB-RR), recebeu parecer favorável da deputada Silvia Cristina (PP-RO) na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, nos últimos dias de atividade legislativa de 2025. Com isso, o texto foi encaminhado à CCJ, responsável por avaliar a constitucionalidade e a juridicidade da matéria.
Embora a constelação familiar seja reconhecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como prática integrativa e complementar, ela não substitui tratamentos médicos ou psicológicos formais. Ainda assim, o método vem sendo utilizado no Judiciário de pelo menos 16 estados e no Distrito Federal, especialmente em varas de família, como ferramenta para mediação de conflitos.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no entanto, não reconhece a constelação familiar como instrumento jurídico válido nem como política pública oficial de resolução de disputas. No campo da saúde e das ciências humanas, a prática enfrenta forte resistência de entidades como o Conselho Federal de Psicologia, que a classifica como pseudociência e alerta para riscos de revitimização, sobretudo em casos de violência doméstica.
Na justificativa do projeto, Duda Ramos afirma que a técnica não possui comprovação científica e se apoia em fundamentos teóricos questionáveis. Segundo o parlamentar, há relatos recorrentes de mulheres em situação de violência doméstica que foram expostas à constelação familiar em processos judiciais, sendo levadas a reviver traumas sem acompanhamento profissional adequado.
Ao apresentar parecer favorável, a relatora Silvia Cristina destacou dados do Mapa da Violência de 2025 para reforçar a preocupação com a segurança de vítimas. Para ela, qualquer prática que estimule a reaproximação entre vítima e agressor representa risco elevado. Na avaliação da deputada, a constelação familiar caminha em sentido oposto à proteção de direitos fundamentais.
No relatório aprovado, a relatora afirma que vedar o uso da constelação familiar no Judiciário é uma forma de resguardar a dignidade das partes vulneráveis, assegurar o devido processo legal e alinhar o sistema de Justiça a práticas respaldadas por ciência, ética e direitos humanos. Segundo o texto, a proibição evita interferências de natureza mística ou ideológica nos processos judiciais.
A constelação familiar é uma abordagem terapêutica sistêmica que utiliza pessoas ou objetos como representantes para encenar dinâmicas familiares, com a promessa de revelar padrões ocultos e traumas. A técnica, porém, é amplamente contestada por pesquisadores e especialistas por falta de evidências científicas.
A aprovação do parecer na comissão foi comemorada por divulgadores científicos e pesquisadores que atuam no combate à pseudociência. Entre eles estão Leonardo Costa, do Instituto de Prática Baseada em Evidências, e Gabriela Bailas, física teórica e pesquisadora de pseudociências, que já participaram de audiências no Senado sobre o tema.
Nas redes sociais, Bailas celebrou o avanço do projeto e afirmou que a constelação familiar viola direitos humanos e não deve integrar o sistema público brasileiro. Segundo ela, após anos de alertas, vídeos, artigos e entrevistas sobre os riscos da prática, o parecer aprovado representa uma vitória concreta no enfrentamento ao uso institucional da técnica.