Maranhense, Paulo José da Silva e Silva nasceu e cresceu em São Luís. É mestre em Ciência da Computação e doutor em Matemática Aplicada, ambos pela USP. No doutorado, ficou seis meses nos EUA trabalhando na Universidade de Rutgers (Universidade Estadual de NewJersey).
Após o doutorado, foi contratado pelo Departamento de Ciência da Computação da USP e em 2012 começou a trabalhar no departamento de Matemática Aplicada da Unicamp. No final de 2018 e o começo de 2019, o professor passou 4 meses como pesquisador visitante na New York University, no Departamento de Ciência da Computação. Hoje, Paulo José é professor livre docente do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (IMECC) da Universidade de Campinas (Unicamp).
Autor do projeto: “Vidas salvas no Brasil pelo isolamento”, o pesquisador criou um site em que, diariamente, atualiza os dados com uma previsão do número de vidas salvas no Brasil por região e em alguns estados do país, de acordo com o isolamento social nesses lugares.
1. Como surgiu a ideia do projeto “Vidas salvas no Brasil pelo isolamento?”
Essa ideia foi da minha colega Claudia Sagastizábal. Ela um dia apareceu com essa ideia em um email para o CeMEAI, que é um Centro de Matemática Aplicada que congrega pesquisadores de várias universidades paulistas. Ela comentou que estava chateada com o comportamento das pessoas nas ruas e veio com a ideia de estimar vidas salvas, tentando dar um viés positivo num mar de notícias ruins. Como estou trabalhando em outra pesquisa relacionada à Covid-19, me dei conta de que o programa que eu estava usando poderia ser adaptado para estimar o número de vidas salvas. Então, começamos a colaborar e saiu o site.
2. Como funciona a projeto “Vidas salvas no Brasil pelo isolamento”? Qual a metodologia adotada?
Nós usamos os dados oficiais para estimar a taxa de reprodução do vírus. Essa taxa é o número de pessoas que um doente infecta, transmitindo a doença, durante o curso da doença no início da epidemia (quando quase todo mundo ainda não tem resistência). A gente estima essa taxa usando técnicas de uma área da matemática chamada otimização, que é a minha área de pesquisa e da Claudia.
Como conseguimos estimar a taxa em diferentes instantes do tempo, conseguimos comparar como ela estava antes de iniciar o processo de quarentena e como ela se comportou nos últimos dias – nós focamos na última semana. Depois disso, usamos os modelos epidemiológicos clássicos para esse tipo de doença, usamos um chamado SEIR, que tem se mostrado adequado para estimar o que vai ocorrer nos próximos dias. Damos as duas taxas para o modelo fazer estimativas. A anterior à quarentena, que é tipicamente mais alta, e a taxa da última semana. Analisando as diferenças entre as duas estimativas, estimamos o número de vidas salvas.
3. Foi feita uma estimativa para os próximos 14 dias tanto no Brasil, como por regiões e ainda alguns estados, incluindo o Maranhão. A que conclusão o estudo chega?
Que o processo de quarentena tem ajudado, e muito, em alguns lugares, por exemplo no Sudeste, um pouco menos no Nordeste e no Centro-Oeste que está mais tranquilo que as outras regiões. Mas, infelizmente, menos em outros, como nas regiões Norte e Sul. A quarentena tem sido fundamental, já que é por enquanto a única forma de mitigação do vírus conhecida, já que não há remédios eficazes ou uma vacina. Mas, infelizmente, ainda não é o suficiente. Mesmo depois da queda, a taxa de reprodução do vírus ainda é alta e, provavelmente, medidas mais duras terão que ser tomadas em breve em vários lugares do Brasil. Como a quarentena parece ser a principal ferramenta que temos na mão, parece que teremos que fazer isso. A opção é aceitar um grande, eu diria quase que insuportável, número de mortes que crescerá rapidamente sobretudo com o colapso dos sistemas de saúde que já começou a ocorrer.
4. Qual a previsão para o possível número de vidas salvas no Maranhão nos próximos dias, caso a população continue adotando as medidas restritivas?
A taxa de reprodução no Maranhão começou alta e até que caiu bastante nas últimas duas semanas. Mas, como disse acima, ainda não é o suficiente. Isso é particularmente grave em um estado que está quase atingindo a sua capacidade máxima de atendimento às pessoas que necessitam de internações nos hospitais. É preciso que as pessoas se conscientizem rapidamente e comecem a levar à sério, até onde for humanamente possível, a quarentena.
5. Ao comparar o Maranhão com o Brasil e com cada região do país, quais números nós temos, no que se refere a vidas salvas, devido ao isolamento social?
Os números de hoje sugerem que no Brasil uma vida será salva nos próximos 14 dias a cada 4.2 minutos. No Maranhão, o número é uma vida a cada 27 minutos. Algo muito significativo. Como disse, apesar da taxa ter baixado no Maranhão, ela começou de um nível alto e ainda há muito a fazer. Assim, peço, fiquem casa, salvem vidas!
6. Dessa maneira, qual a importância do conhecimento científico quando estamos vivendo um momento repleto de achismos, onde uma questão de saúde está sendo politizada nesse momento?
A ciência é o melhor farol que a humanidade encontrou até hoje. Ela é fundamental em todos os aspectos da vida humana, tendo mostrado das mais diferentes formas que é o meio mais eficaz de se chegar a fatos e tomar decisões racionais. Creio que esse será um momento de valorização da ciência no mundo, pois será ela que irá resolver o problema ao gerar uma vacina ou um remédio eficaz. Não é hora de desespero! Os tomadores de decisão não podem se dar esse luxo. Menos ainda de ideologias. Essa é a hora que a mente serena e clara procura as melhores cabeças em busca de soluções.
7. Em um momento grave como a pandemia que vivemos, qual o valor da ciência, da pesquisa, para chegar a esses dados precisos que comprovam a eficácia das medidas restritivas?
Eu, a Claudia e todos os demais pesquisadores do CeMEAI acreditamos que é importante dar informação embasada em fatos com metodologias sólidas e que assim possam servir tanto como um sopro de esperança, como um estímulo a todos. Informações de qualidade também são fundamentais para ajudar os tomadores de decisão a fazerem o que deve ser feito com coragem e liderança.
8. No início da semana que passou, a Ilha de São Luís iniciou o lockdown. Como você vê medidas como essa? Existe uma previsão de quantas vidas deverão ter sido salvas ao final do lockdown?
Tenho apenas a estimativa para o estado todo. Nesse momento o site sugere que 768 vidas serão salvas nos próximos 14 dias, uma a cada 27 minutos. Isso é muito para um estado como o Maranhão. O que todos podemos e devemos fazer é acatar as medidas restritivas, apoiar o isolamento social. Dessa maneira, muitas vidas serão salvas.