Geralmente principal motivo para o acúmulo de gordura no sangue é a alimentação inadequada e excesso de peso. Entretanto, quando os resultados dos exames são muito maiores do que os valores de referência, é preciso investigar a possibilidade de uma doença rara, que afeta de uma a duas em cada um milhão de pessoas no mundo, chamada síndrome da quilomicronemia familiar (SQF).
Normalmente depois de ser absorvida pelo intestino e transportada no sangue, a gordura dos alimentos é decomposta com a ajuda de uma enzima chamada lipase lipoproteica. Em pessoas com SQF, essa enzima está disponível apenas em quantidades muito pequenas ou não funciona adequadamente, fazendo com que as gorduras dos alimentos não sejam metabolizadas e os TGs se acumulem no sangue.
Com isso, nesses pacientes, as taxas de triglicerídeos podem chegar a concentrações de até 10.000 mg/dL ou mais, quando os níveis normais não deveriam passar de 150 mg/dL[3]. Outros sinais da doença são o aparecimento de xantomas (depósitos de gordura na pele), a lipemia retinalis (aparência leitosa dos capilares da retina), o aumento do fígado e baço.
Além de prejudicar os órgãos e causar manifestações físicas, como dor abdominal generalizada, fadiga, alterações gastrointestinais, entre outras, a SQF pode atingir também o sistema cognitivo, gerando dificuldade de concentração, perda de memória ou dificuldade para lembrar dos acontecimentos e julgamento prejudicado.
Afeta, ainda, o emocional do paciente, que tem que lidar com a incerteza constante sobre ter dores, cólicas ou pancreatite aguda, entre outros, podendo causar depressão, ansiedade e isolamento social.
“Como na maioria das doenças raras, a jornada para o diagnóstico pode ser longa. Por ter os mesmos sintomas aos de outras doenças mais conhecidas, a tendência é de investigar patologias mais comuns, antes de seguir para uma investigação genética mais aprofundada”, afirma Ana Maria Pita Lottenberg, Doutora e Mestre em Ciências dos Alimentos pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP).
O diagnóstico pode ser feito por meio do exame clínico ou laboratorial. No primeiro caso, o médico consegue identificar sinais como hepatomegalia, que é o aumento anormal do tamanho do fígado; depósito de gorduras na pele e, em alguns casos, na retina.
“Os pacientes com SQF, geralmente, precisam consultar vários profissionais de saúde e fazer exames médicos laboratoriais frequentes, ao mesmo tempo em que realizam mudanças drásticas no estilo de vida, principalmente na alimentação, para conseguirem controlar os níveis de triglicerídeos”, afirma a especialista.
A alimentação tem um peso muito grande para o paciente que tem SQF. Para a pessoa portadora recomendamos a ingestão de no máximo 10% das calorias de uma dieta na forma de gordura. Para a pessoa que não tem SQF, geralmente indicamos cerca de 30% das calorias totais da dieta em forma de gordura. Ou seja, é uma redução bem drástica.
A doença é muito desconhecida pelo público geral e até mesmo pelos profissionais da saúde. É fundamental que o paciente seja acompanhado por médico e também nutricionista, para adequar a quantidade de gordura da dieta e também torná-la saborosa.
Para dietas de pacientes com SQF, a Dra. Ana Maria Pita Lottenberg recomenda a ingestão de frutas (exceto abacate, que contém muita gordura), verduras, legumes, fontes de carboidratos também são permitidos, com atenção especial aos pães que podem conter bastante gordura, além de grãos como arroz. Entre os alimentos que devem ser evitados estão: óleos, margarinas, manteigas, frutas oleaginosas e todo e qualquer alimento que seja uma fonte de gordura muito grande.
“Devemos estabelecer quantidades adequadas pensando nas necessidades calóricas de cada indivíduo. Mas todos os alimentos que são fonte de gordura devem ser colocados em quantidades menores.O álcool deve ser excluído da dieta porque quando não metabolizado é transformado em gordura e por isso tende a aumentar o triglicérides e deve ser totalmente restrito para o paciente com SQF. É preciso excluir também o açúcar”, destaca a Dra. Ana Maria Pita Lottenberg
O principal cuidado que o paciente com SQF deve ter é a leitura de rótulos para observar os índices de gordura. Os produtos que são comercializados sem rótulos, como pão francês de padaria, devem ser um ponto de atenção pois podem conter quantidade elevada de gorduras.”