O marco legal dos criptoativos, sancionado em dezembro de 2022 pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), passa a valer nesta semana. Entre os principais pontos, o texto inclui no Código Penal a punição contra fraudes e define regras para as exchanges (casas de negociação de criptomoedas).
A nova legislação, recebida com bons olhos pelo setor, complementa as leis que regem o sistema financeiro e abre espaço para uma regulamentação mais detalhada sobre operações com criptoativos. Até então, as regras não eram adaptadas para as operações que envolvem serviços de ativos virtuais.
Para especialistas, o novo marco pode ajudar a evitar golpes como o caso do ex-jogador do Palmeiras Gustavo Scarpa, que teve um prejuízo de R$ 6,3 milhões ao investir em uma empresa que operava com criptomoedas, indicada pelo seu ex-colega de equipe, Willian Bigode.
Apesar de aprovada no fim do ano passado, a legislação tinha 180 dias para entrar em vigor — período para adaptação das corretoras que atuam no mercado. A partir de agora, os operadores são obrigados a cumprir com as normas estabelecidas.
Em decreto publicado na última quarta-feira (14) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ficou estabelecido que o Banco Central do Brasil (BC) será a autarquia responsável por regulamentar e monitorar esse mercado.
O que são criptoativos
Criptoativos são bens virtuais, protegidos por criptografia, com registros exclusivamente digitais — ou seja, não são ativos físicos. As operações podem ser feitas entre pessoas físicas ou empresas, sem a necessidade de passar por uma instituição financeira. Conheça a Crypto Market no Brasil.
Entre os criptoativos, estão, por exemplo, as criptomoedas, como o Bitcoin. A categoria também envolve outros produtos, como tokens (contratos que representam a custódia de algum ativo) e stablecoins (moedas vinculadas a outros ativos, como o dólar, por exemplo).
Ainda fazem parte desse mercado as moedas-meme, que têm chamado atenção após valorizações expressivas — mesmo sendo baseadas apenas em especulação. É o caso da Pepecoin, que avançou quase 7.000% em valor de mercado em menos de 20 dias de existência.
O que muda com a nova legislação?
Na prática, o texto estabelece uma estrutura jurídica, considerada por especialistas um primeiro passo para regulamentação desse mercado.
“Um dos pontos mais importantes é que agora vamos começar a tratar o tema dentro de uma lei específica e que vai trazer inspiração para novas regulações”, explica Renato Opice Blum, advogado especialista em direito digital.
O novo marco legal inclui no artigo 171 do Código Penal (que trata de estelionato) um trecho específico que torna crime irregularidades envolvendo criptoativos. O crime de fraude com a utilização de ativos virtuais ficou definido como:
organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações que envolvam ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.
A pena, para esses casos, é de quatro a oito anos de reclusão, além de multa.
Outro destaque é que as prestadoras de serviços de ativos virtuais, as exchanges, agora só poderão funcionar no Brasil após autorização prévia do Banco Central.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto), Bernardo Srur, o mercado de criptomoedas vinha, até então, operando com supervisão limitada.
“Estivemos concentrados em iniciativas antilavagem de dinheiro, mas sem uma linha condutora do ponto de vista legal. Agora, com o marco, temos esse primeiro norte, que deve criar um cenário regulatório menos fragmentado”, diz.
Para ele, a garantia de segurança jurídica com a nova legislação deve alavancar investimentos no mercado de criptoeconomia brasileiro.
“Dados da Receita Federal dão conta de que, em 2022, o mercado encerrou com um montante total de R$ 195,5 bilhões em transações declaradas por investidores, contra pouco mais de R$ 206,6 bilhões em 2021”, lembra.
organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações que envolvam ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.
A pena, para esses casos, é de quatro a oito anos de reclusão, além de multa.
Outro destaque é que as prestadoras de serviços de ativos virtuais, as exchanges, agora só poderão funcionar no Brasil após autorização prévia do Banco Central.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto), Bernardo Srur, o mercado de criptomoedas vinha, até então, operando com supervisão limitada.
“Estivemos concentrados em iniciativas antilavagem de dinheiro, mas sem uma linha condutora do ponto de vista legal. Agora, com o marco, temos esse primeiro norte, que deve criar um cenário regulatório menos fragmentado”, diz.
Para ele, a garantia de segurança jurídica com a nova legislação deve alavancar investimentos no mercado de criptoeconomia brasileiro.
“Dados da Receita Federal dão conta de que, em 2022, o mercado encerrou com um montante total de R$ 195,5 bilhões em transações declaradas por investidores, contra pouco mais de R$ 206,6 bilhões em 2021”, lembra.
A função do Banco Central
Conforme decreto publicado por Lula na última quarta-feira, o Banco Central será responsável por regular a prestação de serviços de criptoativos, além de autorizar e supervisionar as operadoras do setor. A escolha do BC já era esperada pelos especialistas da área.
“É uma ótima notícia para o mercado. Confio que teremos mais clareza para poder alavancar as boas empresas nacionais e trazer mais investimento para cá”, diz Henrique Conte, sócio da Insignia Digital Assets.
O decreto presidencial distingue os criptoativos (digitais) dos valores mobiliários, como ações, debêntures, bônus e contratos futuros.
Felipe Brasileiro, COO da LoopiPay, ressalta que o BC será responsável pela regulação do setor exceto quando o ativo for enquadrado como valor mobiliário. Nesse caso, a competência será da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão ligado ao Ministério da Fazenda.
“Isso mostra que o Brasil está caminhando para formalização do setor e que há interesse dos reguladores em encontrar, através do diálogo, as melhores formas de implementar essa inovação”, diz.
O advogado Renato Opice Blum lembra, no entanto, que ainda serão necessárias regras mais detalhadas do BC, que devem ser feitas por meio de uma resolução.
“O Banco Central terá que regular toda a estrutura que não envolva valores mobiliários: quais serão as operações permitidas, as regras, o que as exchanges deverão ter, se deverão se credenciar ou garantir algum seguro, qual vai ser o capital social. Aí, sim, teremos uma disrupção na estrutura da negociação das criptomoedas”, explica.
Segurança e reflexos para os investidores
Isac Honorato, presidente do Cointimes e especialista parceiro da Foxbit, afirma que a função do Banco Central de liberar licenças para empresas do setor vai garantir mais segurança para as pessoas que estão iniciando nesse mercado.
“O marco legal deve ajudar a evitar principalmente as práticas de golpe, já que a legislação tende a ser mais rigorosa. Essa é uma forma de diminuir as ações fraudulentas utilizando criptomoedas”, diz.
Para ele, há relação direta com casos como o do ex-jogador do Palmeiras Gustavo Scarpa, que teve prejuízo milionário ao investir em uma consultoria que dizia fazer operações com criptomoedas.
A empresa indicada pelo ex-colega de clube Willian Bigode não tinha autorização para operar no mercado.
Isac explica que o foco, agora, é justamente aumentar essa fiscalização e evitar que pessoas ou empresas consigam atuar de maneira independente no setor de criptoativos.
“Com a regulação do BC, você terá que, no mínimo, pedir licença para participar do jogo. Fazendo um comparativo: não é qualquer pessoa que consegue abrir um banco. Isso vale para o setor. Agora, vamos começar a dificultar a entrada de quem quer aplicar golpes, e ter penas mais duras”, conclui.
O advogado Opice Blum afirma que a nova legislação deve melhorar esse cenário, especialmente, por dois motivos:
haverá um filtro mais apurado, com exigência de um número maior de documentações, junto à definição de obrigações estabelecidas pelo BC para operação das exchanges;
e, por fim, a inclusão do crime de fraude com criptomoedas no Código Penal brasileiro.