Chega ao Brasil nesta semana o exame americano PrecivityAD2, que, a partir de uma amostra de sangue simples, ajuda a identificar a doença de Alzheimer em estágios precoces. A iniciativa de colocar o teste no mercado brasileiro é do Grupo Fleury. O procedimento vai custar R$ 3,6 mil e, por ora, não há cobertura dos convênios.
A disponibilidade de um exame de sangue para diagnóstico da doença é importante para tornar esse processo mais acessível. Ele é quase três vezes mais barato que o PET amiloide (um exame de imagem), que custa cerca de R$ 9 mil e é considerado o padrão-ouro para a identificação do quadro. Ao mesmo tempo, é menos invasivo do que o teste de líquor (esse custa ao redor de R$ 3 500), que depende de punção na lombar, ou seja, uma agulha é usada para coletar o líquido da medula espinhal.
“Esse exame é uma análise de proteínas que estão relacionadas à doença de Alzheimer, a beta-amiloide, tau e tau fosforilada. É feito no plasma (do sangue) e com uma técnica mais recente, que a gente chama de espectometria de massa e é capaz de detectar mínimas variações nessas proteínas”, descreve Aurélio Pimenta Dutra, neurologista do Fleury Medicina e Saúde.
Segundo ele, o que diferencia o PrecivityAD2 de outros testes de sangue já disponíveis no Brasil é a capacidade de captar alterações na tau e também na tau fosforilada. Os demais, explica, focam apenas na beta-amieloide e, por isso, só predizem risco de um quadro clínico estar associado à doença e não tem “capacidade diagnóstica”.
Cabe destacar que o PrecivityAD2 não é um exame de triagem, isto é, não serve para check-up. Ele deve ser aplicado em pacientes que já apresentem sinais e sintomas de declínio cognitivo.
O teste está disponível nas unidades da marca Fleury que ficam no Estado de São Paulo, mas, de acordo com Edgar Gil Rizzatti, presidente de Unidades de Negócios Médico, Técnico, de Hospitais e Novos Elos do Grupo Fleury, em breve deve chegar a todas as unidades do grupo. O exame pode ser realizado mediante pedido médico e o resultado é liberado em cerca de 20 dias.
O PrecivityAD2 é comercializado pela C₂N Diagnostics, uma startup da Universidade de Washington, e foi desenvolvido por pesquisadores da mesma instituição. As amostras coletadas no Brasil são encaminhadas para avaliação nos Estados Unidos. O exame chegou ao mercado americano ainda em agosto. “Estamos preocupados em oferecer uma medicina no ‘estado da arte’”, diz Rizzatti.
Como é feito o diagnóstico do Alzheimer?
O diagnóstico de Alzheimer não é simples. O passo inicial sempre depende da reclamação do paciente ou de quem convive com ele sobre sintomas como falhas na memória. A partir disso, o médico vai aplicar testes neuropsicológicos para determinar se há declínio cognitivo (prejuízos na capacidade de processar pensamentos) em comparação com indivíduos de mesma idade e escolaridade.
Segundo Orestes Vicente Forlenza, professor do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), se os déficits cognitivos causarem incapacitação para atividades usuais da vida diária, estabelece-se o diagnóstico de demência. Se o problema não estiver nesse nível, caracteriza-se o que é chamado de comprometimento cognitivo leve, que pode ser entendido como uma manifestação prodrômica da doença de Alzheimer.
A demência pode ser causada por uma série de quadros, e o principal deles é o Alzheimer. Nessa fase do diagnóstico, o médico pode pedir exames laboratoriais e de imagem para descartar outras causas e fechar um diagnóstico presuntivo de Alzheimer.
No entanto, para ter mais certeza, há exames de biomarcadores – elementos presentes no organismo que podem sugerir a ocorrência de uma doença. Os mais amplamente utilizados e conhecidos são o PET amiloide e a biópsia do líquor. O problema do primeiro é o preço e também o fato de que está disponível em poucos centros no País. Já o segundo é considerado invasivo. Mais recentemente, entraram em cena os exames laboratoriais de sangue.
O que os exames de sangue buscam
A causa do Alzheimer ainda não é clara, mas se sabe que a doença se instala quando o processamento de certas proteínas do sistema nervoso central começa a dar errado, segundo o Ministério da Saúde. Surgem fragmentos de proteínas mal cortadas e tóxicas dentro dos neurônios e nos espaços que existem entre eles, formando placas (lesões). Como nosso corpo falha em eliminá-las, elas se acumulam no cérebro.
Duas proteínas são a marca da doença: a beta-amiloide e a tau. “Aparentemente, a beta-amiloide se acumula primeiro na forma de lesões extracelulares, em volta dos neurônios. Com o progredir da doença, parece que ela desencadeia a deposição de proteína tau em lesões intracelulares, que levam à morte neuronal”, explica Claudia Kimie Suemoto, professora associada da disciplina de geriatria da FMUSP, que faz parte do Advisory Council da Alzheimer’s Association International Society to Advance Alzheimer’s Research and Treatment (ISTAART). Os biomarcadores vão sinalizar o aumento no nível dessas duas proteínas e permitem dizer quem tem ou não a doença.
O Alzheimer ainda não tem cura, mas, fora do País, algumas drogas têm sido usadas de forma experimental. Para um paciente poder ser elegível, é preciso saber os níveis de tau e beta-amiloide. Daí a importância de contar com um diagnóstico cada vez mais preciso. “É um caminho sem volta, (o tratamento) vai chegar no Brasil, vai ser aprovado e a gente precisa de exames assim pra poder indicar”, fala Claudia.