O Banco Central intensificou o controle sobre a concessão de crédito bancário a produtores rurais com inconsistências no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e áreas embargadas, resultando na não efetivação de mais de 30 mil operações, que somavam R$ 6,2 bilhões, apenas no primeiro semestre de 2024. As operações vetadas incluíam casos em que as áreas do empreendimento estavam fora do registro ou com certificados que não correspondiam à localização do imóvel.
Além disso, outras 1,2 mil operações foram barradas pelo Banco Central de janeiro a junho deste ano devido ao não cumprimento de critérios socioambientais vinculados ao financiamento. Esses critérios são verificados através de um cruzamento de dados com diversas bases, incluindo as do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no chamado Bureau de Crédito Rural do BC. Os financiamentos impedidos somavam R$ 726,2 milhões.
Desde 2020, o sistema de verificação do Banco Central já bloqueou mais de 2,2 mil operações de crédito rural por não atenderem aos critérios sociais e ambientais exigidos. O valor desses financiamentos teria ultrapassado R$ 1 bilhão. Durante esse período, produtores rurais em todo o Brasil acessaram mais de R$ 1,4 trilhão em empréstimos bancários.
Esses dados constam no Relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticos do Banco Central. De acordo com o documento, 64 entidades foram supervisionadas no período, sendo que dez delas operam principalmente na Amazônia. O monitoramento do Bureau de Crédito Rural resultou em 68 sinalizações, emissão de dez súmulas de apontamentos e na desclassificação de 342 operações.
“Com a análise de dados pelo Banco Central, as entidades supervisionadas foram confrontadas com indícios de operações de maior risco, contribuindo para o aprimoramento da supervisão prudencial dos riscos sociais, ambientais e climáticos no Sistema Financeiro Nacional”, destaca o relatório.
Controle Mais Rígido e Críticas do Setor Produtivo
O controle se tornou mais rigoroso com a publicação da resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) 5.081/2023, que proíbe a concessão de financiamentos bancários, com ou sem subvenção federal, para propriedades não inscritas ou com inscrições canceladas ou suspensas no CAR.
A resolução também amplia os impedimentos sociais, ambientais e climáticos para o acesso ao crédito rural, estendendo a vedação ao financiamento de áreas embargadas por desmatamento ilegal para todos os biomas, e não apenas para a Amazônia, como era anteriormente.
A medida tem gerado críticas do setor produtivo, especialmente em relação aos embargos. Propostas de revisão estão sendo discutidas em âmbito ministerial. Uma parte do governo defende a rigidez no tratamento das áreas embargadas para coibir ilegalidades, enquanto entidades de produtores argumentam que a resolução expandiu indevidamente o conceito de embargo, penalizando toda a propriedade rural em vez de apenas a área afetada.
“A decisão de bloquear o crédito para a totalidade das áreas embargadas fere a legislação, ignora conceitos legais e afronta as garantias constitucionais dos produtores rurais”, afirmou Thiago Rocha, presidente da Câmara de Modernização do Crédito do Ministério da Agricultura.
Por outro lado, Paulo Pichetti, diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos do Banco Central, destacou que o sistema atual permite um monitoramento em tempo real dos pedidos de crédito rural, afirmando que o BC agora dispõe de um instrumento poderoso para direcionar os recursos do Sistema Financeiro Nacional para atividades sustentáveis.
Especialistas como Mariana Stussi, analista do Climate Policy Initiative (CPI/PUC-Rio), apontam que é necessário avançar no monitoramento do desmatamento em propriedades que recebem crédito rural, exigindo comprovação de autorização para a supressão de vegetação e suspendendo o financiamento para aqueles que não conseguirem comprovar regularidade.
“A evolução contínua dessas normas, assim como sua implementação e verificação, é importante para promover a sustentabilidade no crédito rural”, concluiu Priscila Souza, gerente sênior de Avaliação de Política Pública do CPI/PUC-Rio.