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Decolar é acusada de utilizar esquema irregular na comercialização de passagens

A crise levou à demissão da equipe responsável pelo setor aéreo da Decolar no Brasil

Fonte: Da redação com Valor

A Despegar, holding que opera no Brasil sob a marca Decolar, foi acusada de utilizar um esquema irregular na comercialização de passagens aéreas por meio da chamada tarifa operador, segundo fontes ligadas ao setor. Essa modalidade oferece descontos de até 20% para operadoras de turismo, com o objetivo de incentivar a venda de pacotes, mas a empresa teria usado o benefício de forma inadequada. A Despegar reconheceu a irregularidade após uma auditoria interna, demitiu os envolvidos e afirmou estar sendo alvo de ameaças e tentativas de extorsão por parte de um ex-funcionário, supostamente envolvido na fraude.

Segundo fontes do setor, a prática consistia em incorporar a tarifa com desconto em passagens vendidas individualmente, o que não é permitido. O consumidor pagava o valor integral do bilhete, enquanto a empresa absorvia o desconto originalmente concedido para pacotes. Esse esquema teria ajudado a inflar artificialmente o Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da companhia.

A suspeita veio à tona após uma investigação iniciada pela Latam, um dos principais parceiros da Decolar. O sistema da Latam Travel é fornecido pela agência de viagens e, após identificar inconsistências, a companhia aérea conduziu uma auditoria própria, que levou a Decolar a abrir sua própria investigação. A Gol e a Azul também foram afetadas e estão analisando a situação, mas ainda não se manifestaram publicamente.

A tarifa operador funciona como uma ferramenta para que companhias aéreas consigam preencher voos com baixa ocupação, mas seu uso é regulamentado e deve ser “opaco”, ou seja, precisa estar atrelado a pacotes de viagem e não pode ser vendida separadamente ao consumidor final. Caso um operador viole essa regra, pode sofrer penalidades que vão desde multas até a perda do direito de negociar tarifas com as aéreas.

A revelação do esquema causou desconforto na Prosus, empresa que controla o iFood no Brasil e que comprou a Despegar em dezembro de 2024 por US$ 1,7 bilhão. O grupo, no entanto, declarou que está satisfeito com a forma como a Decolar lidou com o problema e que não pretende revisar o acordo de aquisição ou abrir uma nova investigação.

A crise levou à demissão da equipe responsável pelo setor aéreo da Decolar no Brasil, incluindo quatro funcionários que foram desligados nas últimas semanas. Além disso, um executivo de alto escalão foi demitido na Argentina, sede da Despegar. Com essas mudanças, a área de parcerias terrestres e hotéis assumiu temporariamente as funções do setor de aviação da empresa.

Irregularidades no uso da tarifa operador não são novidade e o modelo tem sido monitorado pelo setor há anos. Entre 2010 e 2015, com o crescimento das operadoras de viagem, as companhias aéreas passaram a exigir comprovação da venda do pacote. Em alguns casos, elas podem solicitar a apresentação de vouchers de hotéis para validar a negociação e evitar fraudes.

A Decolar afirmou, em nota, que nenhum consumidor foi prejudicado e que a auditoria interna detectou apenas 51 reservas irregulares em um universo de 9,7 milhões de passagens comercializadas anualmente. A empresa ainda reforçou que, assim que a fraude foi identificada, todos os envolvidos foram desligados.

Após as demissões, a Despegar afirmou ter recebido tentativas de extorsão e pedidos de compensação financeira para evitar que o caso fosse exposto. A companhia declarou que o responsável pela fraude é justamente quem agora ameaça processar a empresa e que não irá ceder a esse tipo de pressão.

A Despegar ressaltou ainda que passa por auditorias frequentes realizadas pelas companhias aéreas e que qualquer uso indevido de tarifas é corrigido por meio de notas de débito, sendo um procedimento comum no setor. A empresa garantiu que mantém boas relações com as companhias aéreas e que as questões foram resolvidas diretamente com seus parceiros.

O escândalo, porém, levanta dúvidas sobre a veracidade dos dados financeiros da Despegar, uma vez que parte de seu Ebitda pode ter sido artificialmente inflado por essa prática. Fontes indicam que, nos últimos dois anos, a empresa ampliou significativamente a venda de pacotes, passando de 20% para 50% das suas transações com companhias aéreas, o que pode ter impulsionado os lucros. O episódio também coloca em risco as relações comerciais da empresa com as principais aéreas do mercado, essenciais para sua operação futura.

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