A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de decretar a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro provocou forte reação dentro da própria Corte. Segundo relatos de magistrados ouvidos nos bastidores, a medida foi considerada exagerada, desnecessária e juridicamente insustentável, inclusive por ministros que não integram a Primeira Turma — responsável pelo julgamento de Bolsonaro — e também por alguns membros que participam do colegiado. A avaliação predominante é que Moraes acabou se isolando dentro do tribunal no momento em que o STF, e ele próprio, enfrentam intensos ataques vindos do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Entre os integrantes da Corte, a aposta é de que Moraes poderá rever a decisão e recuar da prisão domiciliar, que foi determinada após o ex-presidente se dirigir, por telefone, a manifestantes reunidos em Copacabana no domingo (3). Na ligação, transmitida em viva-voz pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o ex-presidente disse: “Boa tarde, Copacabana. Boa tarde, meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos”. A fala foi interpretada por Moraes como descumprimento das medidas cautelares impostas anteriormente, que proibiam Bolsonaro de usar redes sociais próprias ou de terceiros.
Magistrados apontam uma incoerência técnica entre decisões recentes do ministro. Em despacho anterior, Moraes havia permitido que Bolsonaro realizasse discursos em eventos públicos ou privados, mas, após a manifestação no Rio de Janeiro, determinou a prisão domiciliar. Para parte da Corte, esse contraste fragiliza o argumento jurídico e pode expor o STF a críticas, justamente quando a instituição vinha obtendo respaldo público diante das investidas de Trump contra o Brasil.
Do ponto de vista político, interlocutores do Supremo avaliam que a medida de Moraes quebrou o consenso que vinha se formando em defesa da Corte. Até a prisão de Bolsonaro, pesquisas de opinião indicavam que a maioria da população apoiava a resposta firme do STF e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) frente ao tarifaço imposto pelos Estados Unidos, medida que elevou em 50% as tarifas sobre produtos brasileiros. A narrativa dominante era a de que Trump tentava impor uma chantagem ao país e que a família Bolsonaro colaborava com esse movimento, em detrimento da soberania nacional.
Com a prisão domiciliar, no entanto, analistas políticos e setores empresariais passaram a questionar a atuação do Supremo, transferindo parte das críticas que antes eram dirigidas exclusivamente a Trump para o próprio tribunal. Editoriais de jornais, economistas, advogados e diplomatas passaram a demonstrar preocupação com o impacto da decisão de Moraes sobre a imagem do STF e sobre a unidade institucional que vinha sendo construída em meio à crise diplomática.
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro já protocolou recurso pedindo que Alexandre de Moraes reconsidere a decisão e revogue a prisão domiciliar. Até o momento, o ministro não se manifestou sobre o pedido. A expectativa é de que a controvérsia continue a repercutir tanto no campo jurídico quanto no político, em um contexto de forte tensão entre os Poderes e de desgaste nas relações com os Estados Unidos.