O Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci) publicou, no Diário Oficial da União em agosto de 2025, a Resolução nº 1.551/2025, criando um marco para transações imobiliárias digitais no Brasil.
A norma institui o Sistema de Transações Imobiliárias Digitais, define o Token Imobiliário Digital (TID), credencia as Plataformas Imobiliárias para Transações Digitais (PITDs) e cria a figura dos Agentes de Custódia e Garantia Imobiliária (ACGIs).
O que a nova resolução estabelece e por que isso importa
Na prática, o objetivo é dar parâmetros de governança, compliance e responsabilidade para quem tokeniza e intermedeia direitos sobre imóveis em blockchain ou DLT, bem como organizar a supervisão pelo Sistema Cofeci-Creci. A resolução entra em vigor 60 dias após a publicação, isto é, em meados de outubro de 2025.
Essa iniciativa não acontece por acaso. A tokenização imobiliária já vinha sendo explorada por empresas no país, mas sem regras setoriais específicas. Com o novo texto, passa a existir um ecossistema formal com papéis definidos, das plataformas às estruturas de garantia.
E integração obrigatória com o SGR (Sistema de Governança e Registro) do Cofeci-Creci, que centraliza registros e metadados dessas operações. Advogados e entidades setoriais têm ressaltado o potencial de segurança jurídica e, ao mesmo tempo, debatido os limites da competência do Cofeci em face do sistema registral e da CVM.
Para quem pretende comprar, vender ou fracionar economicamente direitos ligados a um imóvel por meio de tokens, a principal novidade está nos requisitos para que uma operação seja admitida numa PITD.
A plataforma precisa verificar a regularidade do imóvel e dos direitos tokenizados, registrar a operação no SGR, documentar o dossiê digital do ativo e assegurar trilhas de auditoria, segurança da informação e proteção de dados pessoais. Também pode exigir parecer técnico-jurídico sobre a engenharia da tokenização.
Em estruturas com ACGI, esse agente mantém posição jurídica que assegure controle ou garantia sobre o imóvel subjacente e atua fiduciariamente em favor dos titulares dos TIDs. A comparação com o apetite por novidades digitais de investimento também é importante.
Em momentos de pré-lançamento de criptomoedas, muitos brasileiros se interessam por entrar cedo num ativo. No mercado imobiliário tokenizado, porém, a cautela precisa ser maior, porque a relação entre o token e o imóvel exige conferência de credenciais públicas (PITD/ACGI).
Assim como aderência ao SGR e clareza sobre quais direitos reais ou obrigacionais estão, de fato, sendo representados. O investidor que já acompanha cripto pode reconhecer a tecnologia, mas deve observar que, no caso de imóveis, existem camadas adicionais de validação jurídica e registral.
Propriedade continua no cartório: blockchain representa direitos, não substitui a matrícula
A resolução do Cofeci organiza a intermediação digital, mas não altera a base legal da propriedade imobiliária no Brasil. A prova da titularidade continua sendo a matrícula no Registro de Imóveis.
A modernização desse ecossistema ocorre sob o guarda-chuva do SERP (Sistema Eletrônico de Registros Públicos), regulado pelo CNJ desde 2023, que digitaliza serviços e cria padrões de interoperabilidade entre cartórios, sem transformar o blockchain em “livro registral” oficial.
Assim, o TID representa direitos que podem ser reais ou obrigacionais, mas a conversão em propriedade registral (quando prevista) precisa respeitar as regras de registros públicos. O CNJ tem expandido o uso do SERP, inclusive com o Serp-Jud para requisições do Judiciário, o que sinaliza uma infraestrutura pública digital evoluindo ao lado de iniciativas privadas.
O texto do Cofeci reconhece essa realidade e prevê convênios e integrações com órgãos como CNJ e CVM, reforçando que a disciplina setorial de corretores não substitui competências legais de outros reguladores.
A Resolução nº 1.551/2025 exclui de seu âmbito atividades com ativos digitais caracterizados como valores mobiliários e serviços de ativos virtuais prestados por VASPs autorizadas pelo Banco Central, salvo quando esses serviços envolverem diretamente TIDs e forem prestados por uma PITD credenciada.
Ou seja, se a estrutura do token imobiliário tiver natureza de valor mobiliário, a competência é da CVM. Se envolver prestação de serviços de ativos virtuais, aplica-se a Lei 14.478/2022 e a trilha regulatória em fases do Bacen.
A CVM, desde o Parecer de Orientação 40/2022, adota abordagem funcional para enquadrar tokens, o que inclui ativos lastreados em direitos que prometem retorno ao investidor. Em 2023 e 2024, o Banco Central abriu consultas públicas e detalhou os próximos passos da regulação de VASPs.
Com minutas sobre conduta, organização e autorização. Isso significa que estruturas de tokenização que se aproximem de ofertas públicas, distribuição ou negociação com promessa de retorno devem ser avaliadas também sob a ótica do mercado de capitais e da regulação de prestadoras de serviços de ativos virtuais.
Sandbox regulatório e cronograma de adaptação
A resolução permite credenciamento provisório, por até 12 meses, em regime de sandbox regulatório para entidades que já operavam atividades essenciais de plataforma ou de custódia/garantia na data de entrada em vigor.
Nesse período, exige-se observância a princípios e obrigações essenciais, enquanto a entidade se adequa integralmente aos requisitos definitivos. A regra foi desenhada para evitar descontinuidade de operações ao mesmo tempo em que induz padronização, governança e transparência.
Como a norma entra em vigor 60 dias após a publicação, o período de transição começa agora, com a expectativa de que os primeiros credenciamentos e integrações ao SGR se acelerem nos próximos meses.
Esse timing é relevante para incorporadoras, plataformas, imobiliárias e corretores que desejam estruturar produtos fracionados e serviços acessórios, administração de locações, gestão de recebíveis, avaliações e due diligence digital, desde que vinculados a TIDs admitidos.