O Supremo Tribunal Federal (STF), sob comando do presidente Luís Roberto Barroso, aprovou uma resolução que institui um novo benefício mensal de R$ 10 mil a juízes auxiliares e instrutores que atuam nos gabinetes dos ministros. A medida substitui o pagamento de diárias e passa a ser paga diretamente no contracheque dos magistrados, como forma de compensação por perdas decorrentes da convocação para trabalhar na Corte. Apesar de a justificativa oficial alegar que não haverá aumento de gastos, a decisão tem gerado críticas por institucionalizar mais um “penduricalho” salarial dentro do Judiciário.
Com 38 juízes atualmente cedidos de outros tribunais para o STF, o tribunal afirma que a mudança apenas transforma uma despesa variável — as diárias — em uma despesa fixa, facilitando a execução orçamentária e conferindo mais previsibilidade ao gasto. Até o fim de 2023, esses magistrados recebiam até seis diárias por mês, totalizando cerca de R$ 6 mil. No início de 2024, o teto foi ampliado para dez diárias, elevando o valor a R$ 10 mil. Agora, esse mesmo montante passa a ser pago como indenização fixa, independentemente da presença do juiz em Brasília.
O novo formato foi desenhado para eliminar a necessidade de comprovação da estadia na capital federal, um fator que, segundo o STF, traria “ganhos práticos” ao simplificar o pagamento. Na prática, um juiz poderá continuar em seu estado de origem e, com a concordância do ministro, trabalhar remotamente recebendo a compensação mensal. Críticos apontam que essa flexibilização fragiliza os controles de presença e reforça uma lógica de remuneração que escapa às regras do teto constitucional.
Casos anteriores ilustram os problemas que a resolução tenta contornar. Até 2023, o próprio STF vedava o pagamento de diárias a juízes que já residissem em Brasília — como os oriundos do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). No entanto, a Corte flexibilizou essa regra após pedidos dos próprios magistrados, o que permitiu o pagamento de diárias mesmo a quem não saía de seu domicílio, gerando desconforto e questionamentos éticos.
A nova indenização, segundo o texto assinado por Barroso, será corrigida anualmente pelo IPCA, garantindo a reposição inflacionária. Ainda assim, a resolução prevê descontos no valor para juízes que utilizarem imóveis funcionais ou receberem auxílio-moradia. Além disso, a Corte manteve o direito ao pagamento de diárias para deslocamentos fora do estado de origem em eventos oficiais.
Para analistas, no entanto, o principal problema está no caráter permanente do benefício. O economista Bruno Carazza, pesquisador da Fundação Dom Cabral, alerta para o efeito cascata da medida. “O STF deveria ser a instância que coíbe a criação de penduricalhos no Judiciário. Ao contrário, está sinalizando que esses mecanismos de aumento salarial serão mantidos e, pior, replicados por outros tribunais e até pelo Ministério Público. Estamos abrindo mais uma brecha que alimenta os supersalários”, afirmou. Ele também criticou a indexação do benefício pela inflação, destacando que isso reforça sua perpetuidade.
A diretora da plataforma Justas, Luciana Zaffalon, também se posicionou contra a medida. Para ela, a resolução de Barroso representa mais um capítulo da consolidação de privilégios que distanciam ainda mais a magistratura da realidade orçamentária do país.
Além do novo benefício, os juízes cedidos ao STF continuam recebendo uma série de vantagens. Esses magistrados, oriundos de tribunais estaduais, já têm direito a equiparação de salário ao de ministro do Supremo, além de vantagens pessoais que, em alguns casos, dobram seus vencimentos. A título de exemplo, um juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo recebe cerca de R$ 37 mil, podendo ultrapassar esse valor com adicionais, e ainda recebe no STF um extra fixo de R$ 4 mil.
A nova resolução também altera as regras de permanência desses magistrados. Agora, os juízes auxiliares poderão atuar por um ano, prorrogável por igual período, e os instrutores, por até dois anos. Cada ministro poderá contar com até três juízes, salvo exceção já em vigor para o ministro Alexandre de Moraes, que tem autorização para manter quatro.
Entre janeiro e março deste ano, o gabinete de Moraes passou por mudanças, com a saída de dois juízes auxiliares e um instrutor, entre eles o desembargador Airton Vieira, considerado braço-direito do ministro em processos criminais desde 2018. A movimentação interna sinaliza uma renovação nos gabinetes, em meio às mudanças estruturais promovidas por Barroso.